A crença num "Arquiteto do Universo"
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A crença num "Arquiteto do Universo"


Pergunta: Se não cremos num "Arquiteto do Universo", parece-me que a vida se torna completamente sem significação. Que há de mal nesta crença?

KRISHNAMURTI: Sem dúvida, por "Arquiteto do Universo" estais entendendo "Deus", só que lhe estais dando um nome diferente. Ora, que é crença? Que significa esta palavra — não a significação que se encontra no dicionário, mas qual é o seu conteúdo psicológico?

E qual é o processo mental que torna necessária a crença? Que vos faz dizer "Creio em Deus" ou "Não creio em Deus". Qual o impulso psicológico que impele a mente a aceitar ou a rejeitar a crença em Deus, num "Arquiteto do Universo"? Enquanto não descobrirmos isso, o mero crer ou descrer muito pouco significará.

É óbvio que, se desde a meninice vos ensinam a crer em Deus, cresceis crendo, exatamente como outra criança que é ensinada a não crer, cresce não crendo. Um é chamado crente e o outro ateu, mas os dois estão condicionados. Quando credes num "Arquiteto do Universo", o fazeis porque vos ensinaram a crê-lo desde a infância e vossa mente se impregnou desta ideia; ou, ainda, sentis ser esta vida tão instável, tão fluida, que vossa mente se apega a uma ideia de permanência e a esta permanência chamais Deus, ou por outro nome qualquer, conferindo-lhe certos atributos. Isto não está nem certo nem errado, pois representa o processo real da mente. Vendo-se ao redor de nós tanta miséria e tanto caos, tanta transitoriedade, tanta falta de paz interior e exterior, a mente cria e se apega a uma coisa atemporal, eterna, uma coisa perenemente bela, repleta de paz. Assim, pois, por causa da incerteza em que se vê, a mente cria sua própria certeza. Mas a mente que crê ou descrê, que aceita ou rejeita, nunca descobrirá o que é Deus. Deus é para ser encontrado, descoberto, não se deve crer nele. Para descobri-lo, a mente tem de estar livre tanto da crença como da descrença. Positivamente, esse estado que chamamos "Deus", essa realidade atemporal, tem de ser algo totalmente novo, nunca imaginado, nunca dantes experimentado. E só uma mente livre pode descobri-lo, e não aquela que está amarrada a um dogma, uma crença.

Afinal, se observardes, se pensardes um pouco a este respeito, vereis que a mente é resultado do tempo — sendo "tempo" memória, experiência, conhecimento. Isto é, a mente é resultado do conhecido, do passado, de muitos milhares de anos. Ora, com esta mente estamos procurando o Desconhecido, esta certa coisa que se pode chamar Deus, a Verdade, ou como preferirdes. Mas essa mente não pode encontrar o desconhecido, pois só pode "projetar" o conhecido, no futuro. Qualquer crença nutrida pela mente é resultado de seu próprio condicionamento. Toda fórmula ou conceito especulativo é resultado do conhecido. Todo movimento da mente para investigar o desconhecido, é totalmente inútil e vão, porque a mente só pode pensar em termos do conhecido. Quando compreende esse processo total e fica, portanto, livre do conhecido, a mente se torna muito serena, completamente tranquila; e só então pode existir o "desconhecido". Com efeito, isto é meditação; não é "projeção" do conhecido no futuro e a adoração desta projeção.

Krishnamurti — Da solidão à plenitude humana





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