Consciência Cósmica e Alucinação
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Consciência Cósmica e Alucinação


Parece que a apreensão da consciência cósmica se verifica de forma mais ou menos agitada, pois no princípio o indivíduo teme que o novo sentido seja um sintoma de alguma forma de insanidade. Maomé sentiu-se muito temeroso. Penso que tanto Paulo como os outros que serão mencionados adiante se sentiram assim afetados. 

A primeira indagação que todos se fazem, depois de ter experimentado o novo sentido, é: o que vejo e o que sinto representam a realidade ou estou sofrendo de uma alucinação? Embora a nova experiência pareça ainda mais real do que os antigos ensinamentos da consciência simples e da autoconsciência, isso a princípio não infunde confiança, pois é sabido que a alucinação, quando se apresenta, toma conta da mente com segurança à da realidade. 

Seja ou não verdade, cada pessoa que passou pela experiência crê forçosamente em seus ensinamentos, aceitando-os como tão absolutos como outros ensinamentos que possa ter recebido. Entretanto, isso não bastaria para demonstrar a sua veracidade, pois poderíamos dizer o mesmo sobre as alucinações de um demente. 

Como, então, saberemos que se trata de um novo sentido, fato revelado, e não uma forma de insanidade, lançando o sujeito na alucinação? Em primeiro lugar, as tendências da mencionada condição são de todo diferentes e até mesmo opostas às da alienação mental. Essas últimas caracterizam-se por ser amorais ou até mesmo imorais, enquanto que as primeiras são altamente morais. Em seguida, enquanto que em todas as formas de insanidade se reduz a inibição, que algumas vezes chega mesmo a desaparecer, na consciência cósmica ela sofre um aumento. Essa última afirmação pode ser amplamente provada pela vida dos homens aqui citados como exemplo¹. Em terceiro lugar, não importa o que digam os escarnecedores da religião, é certo que a civilização moderna, em sua maioria, continua apegada aos ensinamentos do novo sentido. Os "mestres" são ensinados por ele e o resto do mundo por eles, através de seus livros, seguidores e discípulos, de tal forma que se considerássemos o que aqui denominamos consciência cósmica como uma forma de insanidade, enfrentaríamos o fato (absurdo) de que toda a nossa civilização, incluindo as mais importantes religiões, estaria mergulhada na alucinação. Mas, sem alimentar absurda alternativa, podemos sustentar que a evidência da realidade objetiva que corresponde a essa faculdade é a mesma que temos quanto à realidade de qualquer outro sentido ou faculdade. Exemplifiquemos com a visão: Sabemos que a árvore que está lá do outro lado do campo, a meia milha de distância, é real, não uma alucinação; sabemos disso porque todas as outras pessoas que possuem o sentido da visão podem vê-la também, e se fosse uma alucinação só seria visível para nós mesmos. Utilizando o mesmo raciocínio, estabelecemos a realidade do universo objetivo, registrando a consciência cósmica. Todas as pessoas que possuem a faculdade relatam as mesmas experiências ou fatos. Caso três homens olhassem a árvore e meia hora depois lhes fosse solicitado desenhá-la ou descrevê-la, os três desenhos ou descrições não seriam idênticos, discrepariam num ou noutro detalhe, mas corresponderiam em seus traços gerais. Assim ocorre com os relatos daqueles que passaram pela consciência cósmica: são semelhantes na essência, embora divirjam mais ou menos nos detalhes (e essas divergências bem que podem ser o resultado de nossa má interpretação). Não há registro de uma pessoa que tenha passado pela consciência cósmica, negando ou disputando com os ensinamentos de outra que tenha experienciado o mesmo. Embora Paulo, devido as suas experiências anteriores, estivesse pouco predisposto a aceitá-los, tão logo sofreu a consciência cósmica percebeu que os ensinamentos de Jesus eram verdadeiros. Maomé aceitou Jesus não só como o maior dos profetas, mas como alguém que se achava num plano superior ao de Adão, Noé, Moisés e os outros. Ele diz: "E enviamos Noé e Abraão e pusemos na semente deles a profecia e o livro; e alguns deles foram guiados, embora muitos deles fossem trabalhadores da abominação! Então, seguimos suas pegadas com nossos apóstolos; e os seguimos com Jesus, o filho de Maria; e lhe demos o evangelho; e pusemos no coração de seus seguidores a bondade e a compaixão" (153. 269). E Palmer dá seu testemunho: "Maomé vê o nosso Senhor com veneração especial e chega ao ponto de chamá-lo de 'Espírito' e 'Palavra' de Deus e de 'Messias' (152.51). Walt Whitman aceita os ensinamentos de Buda, Jesus, Paulo, Maomé, especialmente de Jesus, que conhecia melhor. Como ele declara: "Aceitando os evangelhos, aceitando-o a Ele que foi crucificado, sabendo com certeza de que Ele era divino" (193: 69). E se, como Whitman uma vez desejou: "Os grandes mestres pudessem voltar e estudar-me" (193: 20), é certo que todos o acolheriam como "um irmão do cúmulo radiante". Assim, todos os homens que esse escritor sabe terem sido iluminados estão de acordo quanto aos detalhes essenciais e com todos os mestres do passado também iluminados. Também parece que os homens livres de preconceito, que conheçam algo sobre mais de uma religião, reconhecem, como Sir Edwin Arnold, que as grandes crenças são "Irmãs", ou, como diz Arthur Lillie, que "Buda e Cristo ensinaram doutrinas semelhantes". (110 . 8)

Richard Maurice Bucke em Consciência Cósmica - estudo da evolução da mente humana


¹  (Gautama, Jesus, Paulo, Plotinus, Maomé, Dante, Las Casas, Juan Yepes, Francis Bacon, Jacob Behmen, William Blake, Balzac, Walt Whitman). 




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