Como posso vencer o temor?
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Como posso vencer o temor?


Conhecemos várias formas de temor — o temor à opinião pública, o temor da morte, temor do que digam os outros, temor de perder um objeto; há inumeráveis formas de temor. Você pergunta: "Como posso vencer o temor?" Pode-se vencer alguma cosia? Sabe o que significa vencer, dominar, "ficar por cima" de alguma coisa, reprimi-la, excedê-la? Quando você domina uma coisa, terá de voltar a dominá-la, não é verdade? Nessas condições, o próprio processo de dominar é uma atividade contínua de constante dominar. Você não pode dominar seu inimigo, porque, justamente ao dominá-lo, você o faz mais forte. Este é um dos fatores. 

Temos interesse em compreender o temor e em procurar as coisas que ele implica. Vamos viajar juntos. Como vem à existência, o temor? Trata-se da palavra "temor", ou do "fato" temor? Compreende? É a palavra que está me causando temor, ou o fato, a existência real de uma coisa em relação com outra? Qual desses dois está causando o temor? Isso não é complexo; é muito simples, se observar bem. 

Tenho medo à palavra "temor"? Averiguemos. Ora, que acontece quando sentimos medo? A reação óbvia, é fugir dele, por muitas maneiras — embriagues, mulheres, templo, mestre, crenças; todas estas coisas estão no mesmo nível; não há melhores e nem piores. O homem que foge ao temor pela embriagues é tão virtuoso como o que foge do medo pela virtude. Socialmente, poderá haver diferença de valores, mas, mentalmente, psicologicamente, é tudo a mesma coisa. 

Qual é nossa reação, diante do temor? Fugir. isto é, nossa reação ao temor é de condenação, — não é verdade? — ou de justificação. Estou realmente com medo? Penso na frase "estou com medo" na hora que estou fugindo? Não penso, certamente. Não posso compreender o temor, se fujo dele, se o justifico ou condeno, ou mesmo, se com ele me identifico ou se digo "estou com medo" e raciocino. Assim, se desejo compreender o temor, não deve haver fuga. Mas nossa mente está constituída de fugas. Por isso não quer enfrentar aquela coisa, compreendê-la, reagir, descobrir o que está causando o temor; por essa razão, fujo ao temor. 

Que é então importante, o temor ou a fuga do temor? Fugir dele, não é verdade? Não a maneira de dissolvê-lo, mas sim a maneira de fugir dele. Estou mais interessado no fugir do que no compreender. E posso compreendê-lo, se estou olhando noutra direção? Só posso vê-lo bem se me concentro em torno dele. Existe a possibilidade de um percebimento completo, de completa concentração em torno do tempo, se estou sempre a correr dele? Não existe, evidentemente. 

Para compreender o temor, não fuja, por meio de repressão, domínio, virtude, etc. Assim você ficará mais perto do fato que está causando o temor. Qual a sua relação com esse fato? É uma relação verbal? — verbal, no sentido de que a mente especula a respeito e teme a especulação; a mente prevê e diz: "Se acontecer isto, acontecerá aquilo; por isso tenho medo". Qual é, pois, a sua relação com aquele fato? Atente bem, pois dessa relação depende a sua solução. Você está em relação com o fato que causa o temor, apenas verbalmente — isto é, especulativamente — ou o está defrontando sem especulação, que significa sem verbalização? Se está em relação com ele verbalmente, não tem então comunhão direta com ele. Se o está olhando de frente, então não está fugindo, não há evasão de sob forma alguma. 

Consideremos agora a relação das palavras e de sua significação. O temor é causado pela palavra ou pelo fato? Visto que a palavra é a mente, a mente está criando uma cortina de proteção, pela verbalização, a fim de não encarar o temor. Será, então, o temor criado pela palavra? — isto é, pela mente, que se põe a pensar a respeito, sendo o pensamento processo de verbalização? Se assim é, pensar a respeito do temor significa fugir dele. Em caso contrário, você está encarando o fato sem verbalização, sem processo de pensamento, sem evasão; você está em relação direta com ele, em comunhão direta com ele. 

Quando você está em comunhão direta com alguma coisa, que acontece? Você já esteve diretamente em comunhão com alguma coisa, sem processo de pensamento? Evidentemente, nunca esteve. Quando você se acha nesta comunhão direta, a coisa a que você deu o nome de temor, deixou de existir. São as cortinas de proteção, as fugas, a verbalização, esse processo mental, que criam o temor, e não o próprio fato. Essas cortinas existentes entre você e o fato, produzem o medo, e não o fato; não existe a necessidade de dominar o fato. Se você percebe o processo na sua inteireza, se o acompanhou, passo a passo, verá que você não tem mais temor. Está, então, observando o fato, e o fato vai operar a modificação, o fato vai encarregar-se da ação, e não você, em seu movimento de fuga. 

Krishnamurti em, Quando o pensamento cessa




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