Encontrando uma vida com profundidade
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Encontrando uma vida com profundidade


Achyut: Senhor, que profundidade podemos atingir?

Krishnamurti: Poderíamos fazer a pergunta de outra forma? A maior parte de nossas vidas é muito superficial, e é possível viver em grande profundidade e agir superficialmente? É possível que a mente habite ou viva em grande profundidade? Não sei não se não estamos perguntando e mesma coisa. Vivemos superficialmente, e a maioria de nós está satisfeita com isso.

Pupul: Nós não estamos satisfeitos. Porém, não sabemos como nos aprofundar.

K: A maioria de nós suporta a vida. Agora, como a mente pode penetrar em profundidades maiores? Estamos discutindo a profundidade em termos de avaliação? A profundidade envolve uma avaliação, mas quero deixar bem claro que não estamos usando a palavra no sentindo de meditação, ou no sentido de tempo, mas como algo mais profundo. O sentido dessas palavras está ligado ao tempo, mas tiraremos dela todo o sentido de tempo e de medição. Estamos perguntando se a mente que, em geral, vive na superfície, pode descer a uma grande profundidade. Essa é a pergunta. Eu afirmo que ela precisa de uma reserva de energia, de um impulso, e pergunto: como deve ser desenvolvida essa energia?

Pupul: Eu não conheço outra dimensão. É preciso uma reserva de energia que dê um impulso. Como a energia deve ser desenvolvida, ou está pergunta está errada?

K: Vamos esquecer a palavra "energia", por enquanto. Eu levo uma vida muito superficial, e vejo a beleza, intelectual ou verbal, de uma vida, de uma mente que tenha penetrado em si mesma de um modo realmente profundo. Agora, eu digo a mim mesmo que eu percebo a beleza disso, que eu vejo a qualidade disso, e pergunto: Como isso pode ser conseguido? Falemos a respeito, em vez de falar sobre a energia e tudo o mais. Como isso deve ser feito? O pensamento pode ser aprofundar? O pensamento pode se tornar profundo?

Por favor, senhores, ouçam. Eu levo uma vida superficial. Quero levar outro tipo de vida, com profundidade. Eu entendo a profundidade, não com o sentido de avaliação ou de tempo para me aprofundar, mas entendo-a como algo incompreensível, como algo que não se pode entender, e quero entender e viver assim. Agora, digam-me o que devo fazer? Eu não sei. Estou perguntando se o pensamento, que é tempo, que é o passado, pode chegar a essa profundidade?

Apenas ouçam o que eu estou dizendo. Eu vejo muito claramente que qualquer profundidade mensurável ainda constitui um tipo de avaliação. Eu vejo esse aprofundamento como se ele dependesse do tempo; pode levar anos e, portanto, eu o vejo intelectualmente, raciocinando; vejo que a profundidade significa uma qualidade atemporal, incomensurável, um infinito cujo fundo não pode ser alcançado. Não se trata, para mim, de um conceito verbal. Eu apenas o coloquei em palavras para vocês. portanto, ele se transforma num conceito.

Maurice Frydman: O senhor está me perguntando ou eu estou fazendo a pergunta para mim mesmo?

K: Eu estou fazendo a pergunta para mim mesmo e, portanto, pedindo a vocês que façam a mesma coisa. Vejo que a minha vida é uma vida superficial. Isso é óbvio. Portanto, eu digo a mim mesmo: o pensamento pode chegar a essa profundidade, já que ele é o único instrumento que tenho?

Questionador: Nesse caso, nós não podemos usar esse instrumento.

Radha Burnier: Como alguém chega a essa profundidade sem usar esse instrumento?

K: Eu levo uma vida muito superficial, e quero descobrir por mim mesmo se há alguma profundidade que não seja mensurável, e constato que o pensamento não pode alcançá-la, porque o pensamento é um tipo de medida, o pensamento é tempo, o pensamento é a resposta do passado; portanto, o pensamento provavelmente não pode entendê-la. Então, o que isso causará? Se o pensamento não pode entendê-la e este é o único instrumento que o homem tem, então, o que ele deve fazer? O pensamento, na sua atividade, na sua função, criou este mundo superficial no qual vivo, do qual faço parte. Isso é óbvio. Ora, é possível para a mente, sem o uso do pensamento, compreender algo que seja incompreensível? Não só em alguns momentos do meu sono ou quando estou andando sozinho, mas viver assim. Minha mente diz que a profundidade precisa ser descoberta para que a mente tenha essa qualidade — tenho de estar ciente dessa profundidade estranha e incompreensível de algo que não tem nome.

Pupul: Algo em que alguém penetra, se aprofunda?

K: Eu não usaria essas palavras.

Pupul: O senhor pode penetrar no que é o pensamento?

K: Nós já discutimos isso. O pensamento é tempo, o pensamento é medida, o pensamento é a resposta da memória, o pensamento é conhecimento, é experiência, passado; portanto, o passado é tempo. Esse pensamento tem de atuar sempre superficialmente. Isso é simples.

Pupul: O que o senhor acabou de dizer resulta numa grande abstração.

K: Não concordo.

Pupul: Resulta, sim, senhor.

K: Não se trata de uma abstração, mas de uma realidade. Mas, o que é o pensamento?

Pupul: O senhor disse que o pensamento é tempo. O senhor abstraiu isso do pensamento.

K: O pensamento não pode entender isso. Isso é tudo. Deixe-o como está.

Pupul: Sendo ele o instrumento que avalia, o senhor pode entender esse instrumento?

K: Não; eu estou interessado na profundidade, não no mecanismo de avaliação. O mecanismo de avaliação é razoavelmente óbvio. Eu não preciso me aprofundar em tudo isso.

Pupul: Se o senhor diz isso, então, eu pergunto: Em que dimensão alguém pode penetrar? Se não se tiver o pensamento, sendo ele o único instrumento que conhecemos para isso, em que dimensão alguém pode penetrar sem o pensamento?

K: Não se trata de aprofundamento.

Pupul: Então, do que se trata?

Q: Nós ainda estamos ligados ao mecanismo disponível de construção que temos, o qual não está em posição de revelar esse estado insondável, no qual queremos viver, porque a linguagem é delicada. Esse instrumento é frágil demais. Nós temos de ter a linguagem apropriada para trabalhar com essa dimensão. temos de ter a ferramenta ara a comunicação.

Pupul: Qual é a ferramenta? A linguagem é frágil demais. Eu não posso dizer ao senhor "como" quando me encontro nesse estado.

K: Estamos interessados na comunicação verbal ou estamos interessados em atingir a profundidade?

Q: Eu sei que, às vezes, eu a atinjo. Como posso falar sobre esse estado com o senhor?

Pupul: O senhor disse que não usa o instrumento que tem, que é o pensamento.

Radha Burnier: Mas, eu acho que Krishnaji mostrou a diferença: não é uma questão de sentir isso, ocasionalmente, mas de estar nisso, de viver com isso.

K: Quando você come, o apetite desperta. Ao levar uma vida superficial, como os seres humanos levam, eu digo a mim mesmo que eu gostaria de atingir essa profundidade onde há grande amplitude e beleza, algo imenso. Ora, o que devo fazer? Qual é a outra operação ou o outro movimento que deve acontecer quando o pensamento não está funcionando? A mente pode continuar sem limites?

Pupul: Nesse caso a pergunta é: Esse estado pode vir a existir onde não há limites?

K: Isso é tudo. Durante toda a sua vida, você conheceu o que são limites. Agora, pergunto a vocês: A mente pode existir sem limites?

Pupul: Se eu tivesse de perguntar a você "como", vocês diriam "não". A única coisa que resta, então, é observar a sua mente avaliando, porque não existe outra maneira.

K: Você fez isso? Você observou, a mente observou seus movimentos e avaliação?

Pupul: Sim.

K: Comparando, avaliando e finalizando. Em seguida, o que acontece?

Pupul: Em seguida vem a quietude.

K: Você diz que o movimento de avaliação chegou a um fim. Isso está certo? Você pode, honesta e realmente, dizer que o movimento com avaliação chegou ao fim?

Pupul: Neste momento ele chegou a um fim.

K: Isso não é bastante bom. Bastante bom significa que, através da minha vida, a avaliação terminou.

Pupul: Como posso saber isso?

K: Eu vou descobrir. Eu quero descobrir se a minha mente, que foi condicionada ao movimento de avaliação — avaliação que equipara comparação, imitação, aquiescência, um ideal, uma resistência que a salvaguarda da não-avaliação — eu quero descobrir se a mente pode dizer: "agora eu entendi todo o movimento de avaliação e vejo onde é o seu legítimo lugar e onde ela não cabe?"

Pupul: Como isso é entendido pela mente na qual não há pensamento?

K: Ela percebe. Demonstrarei isso para vocês. O pensamento examinou-a, analisou-a num determinado momento; o pensamento indagou, insistiu, ponderou e afirma ter visto todo o movimento de avaliação e que a verdadeira percepção desse movimento é o fim desse mesmo movimento. A verdadeira percepção do movimento, isto é, o próprio ato de ver é a atividade e o fim da atividade. Ver que esse movimento é tempo, medida, ver todo o seu esquema, a sua natureza, a sua estrutura, essa verdadeira percepção age no sentido de colocar fim a esse movimento. Portanto, o ato de ver é o ponto final. Não há nenhum esforço envolvido nisso. Você diz: "Eu vi isso." Viu mesmo?

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