Krishnamurti - O Amor está no aniquilamento do conhecido
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Krishnamurti - O Amor está no aniquilamento do conhecido


               O trem para Florença desenvolvia uma velocidade de 150 quilômetros horários. Aquela paisagem nos era familiar: as cidades sobre as encostas dos morros, o lago, a oliveira, o cipreste e a estrada paralela à linha do trem. A terra recebia contente a chuva que caía depois de um longo período de seca, tornando os rios caudalosos e barrentos e reanimando a vegetação. O trem seguia por entre os vales, causando estardalhaço nos cruzamentos e, sempre que reduzia a marcha, os trabalhadores do local acenavam aos passageiros. Manhã agradável e fria, em que o outono tingia as folhas de ocre e amarelo; os camponeses aravam fundo a terra para a semeadura do inverno, e era acolhedora a visão dos morros centenários de pouca altura. Assim que o trem retomou a velocidade habitual, seus condutores nos saudaram, convidando-nos a visitar sua cabine, pois nos conheciam das anteriores viagens. Esse convite fora feito pouco antes da partida do trem e, agora, sua atitude era tão afável e acolhedora quanto a dos rios e dos montes. De sua cabine tinha-se uma visão completa da paisagem, que parecia à espera do costumeiro apito do trem. O sol iluminava alguns dos montes e a superfície da terra parecia sorrir. Rumo ao norte, o céu clareava, contrastando com o delicado esplendor do cipreste e da oliveira. A terra, como sempre, estava bela.
               A noite já ia alta quando a meditação invadia os espaços do cérebro. Ela não significava conflito, a luta entre o que é e o que deveria ser; livre do controle, movimento algum perturbava aquela aquele estado. A contradição entre o pensador e o pensamento estava ausente, pois nenhum dos dois existia. Restava apenas o ver, sem o observador, cuja ação brotava do inexplicável vazio. A relação entre causa e efeito conduz à inatividade, isso que em regra denominamos ação.
Estranha coisa o amor, que se tornou tão respeitável: o amor a deus, o amor ao semelhante, o amor à família. Primorosamente demarcado como sacro e profano, como dever e responsabilidade, como disciplina e sacrifício, tanto os padres como os generais, ao planejarem as guerras, invocam o amor. Os políticos e as donas-de-casa sempre se queixam dele. O ciúme e a inveja alimentam o amor, que serve de prisão a toda forma de relacionamento. Ele está nas telas dos cinemas, nas páginas das revistas, e cada estação de rádio e televisão o apregoa. Ao findar o objetivo do amor, surge a foto emoldurada na parede, ou a imagem cultivada pela memória ou pela crença. Esses valores passam de geração a geração, sem que o sofrimento tenha fim.
A continuidade do amor resulta no prazer, sempre acompanhado da aflição; apegados ao prazer, lutamos para nos desvencilhar da dor. Através da continuidade se busca a permanência e a certeza nas relações.
Ao evitar-se qualquer mudança nas relações, fica-se enredado na sensação opressiva da segurança e na agonia do hábito. E, tachando de amor esse fluxo incessante de prazer e dor, tornamos-nos prisioneiros daquela obsessão. Para escapar ao tédio buscamos refúgio na religião e no romantismo, variável de acordo com as pessoas, que, em verdade, é uma fuga eficaz perante o fato do prazer e da dor. Sem esquecer, é claro, deus, o maior apelo e a derradeira esperança da humanidade, e o qual se tornou tão respeitável e lucrativo.
Nada disso é amor. Não há continuidade no amor; ao contrário da memória, ele ignora o amanhã ou o futuro. As recordações nascem das cinzas do passado, mas o amor é livre do jugo do tempo e desconhece a promessa, a esperança e ou o desespero. O cérebro não pode conceber o amor, pois este não pertence a nenhuma crença, símbolo ou sentimento. De sua eterna morte e ressurreição advém a destruição definitiva, o aniquilamento do conhecido, os quais são o próprio amor.

Krishnamurti - 04 de outubro de 1961
Diário de Krishnamurti - Cultrix




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