O Coração na Yoga - Pedro Kupfer
autoconhecimento

O Coração na Yoga - Pedro Kupfer



"Quando usamos a expressão “fazer as coisas com o coração”, de modo geral nos referimos a agir com a motivação certa, desde uma postura de franqueza e honestidade. Por outro lado, dizer que alguém tem “o coração frio” aponta para uma situação em que a pessoa totalmente centrada no próprio interesse, ou que não tem sensibilidade, ou que age com frieza e egoísmo, sem levar em conta os demais.

Nas escrituras do Yoga a palavra coração sempre aparece vinculada à consciência, ou a uma maneira de se referir a ela a partir do corpo. Por exemplo, o Yogasūtra (III:35), afirma que “[meditando no] coração, o yogui  adquire conhecimento da própria Consciência”.

Por outro lado, a Śvetaśvatara Upaniṣad (II:8), um texto muito mais antigo que o próprio Yogasūtra, ensina o seguinte: “Mantendo o corpo firme, como as três partes eretas [tronco, pescoço e cabeça], o sábio dirige os sentidos e a mente ao interior do coração. Brahman é o barco em que ele atravessa o rio do medo”.

Assim, vemos que o coração ocupa um lugar central no processo do autoconhecimento, pois é uma referência, um ponto de conjunção, digamos assim, entre corpo, mente e Consciência.
Por exemplo, quando nos referimos a nós mesmos, apontamos naturalmente com as mãos para o coração. Quando precisamos fazer referência às coisas do
ego, também apontamos para o coração.

A Kaṭha Upaniṣad (I:2:20), outro texto antiquíssimo de Yoga, declara que o coração é o lar da Consciência: “Menor que o infinitesimal, maior que o grandioso, o Ser reside no coração de todas as criaturas. Aquele que domina [a identificação com] seus próprios desejos liberta-se de todo sofrimento e, com a mente e os sentidos em paz, percebe a grandeza do Ser”. Assim, podemos considerar que o coração seja uma espécie de ponte entre o finito e o infinito, entre o corpo-mente e o Ser.

Na fisiologia sutil do Haṭha Yoga, fala-se do “nó” (granthi) do chakra cardíaco que limita, através dos karmas, a experiência da consciência ilimitada apenas ao ego, à mente ou ao corpo físico.

Usando diferentes ferramentas, o yogui tenta cortar esse nó e se libertar dele. Porém, essa escravidão é aparente, mesmo quando para a pessoa identificada com seus condicionamentos essa seja a única realidade. Essa situação acontece porque ela está enredada nos próprios karmas e não enxergar além deles.
O desejo de vencer a morte, de compreender o que há antes e depois dessa passagem, é tão antigo quanto universal. Na tradição da Índia, “vencer a morte” significa abrir o coração, como fica claro nesta outra passagem da obra que acabamos de citar: “Desfazendo os nós que estrangulam do coração, o mortal torna-se imortal. Essa é a síntese dos ensinamentos das escrituras” (II:3:15).
Os “nós que estrangulam o coração” são as falsas crenças, os condicionamentos e ideias equivocadas que temos sobre nós mesmos."
Pedro Kupfer em Com o Coração





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