O Milagre já aconteceu - Nisargadatta Maharaj
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O Milagre já aconteceu - Nisargadatta Maharaj



"Quando se atinge a iluminação, a visão total atingida é tão clara que o indivíduo não faz mais do que rir e até, em aparência, ser irreverente, quando vê a fantástica superestrutura de superstições, ilusões e mistérios que está erigida (pelas nossas crenças e religiões, tradições, costumes e cultura, suposições e sociedade) sobre e em torno da simplicidade elementar que é a Verdade.

Quando você está interessado na verdade, na realidade, você deve questionar todas as coisas, mesmo sua própria vida. Ao crer na necessidade de uma experiência sensorial e intelectual emocionante, você limita sua investigação à busca de satisfação e de conforto.” (E não vai à busca da Verdade).

Enquanto houver um corpo e uma mente para proteger o corpo, existirão atrações e repulsões (devidos às limitações da mente individual em face de suas ilusões, suposições, crenças, cultura etc.). 

Existirão no campo dos fatos, mas não devem trazer preocupação para aquele que está compreendendo. O foco de sua atenção estará em outro lugar (além da mente). Não estará distraído.

Este que vê o tudo isto e também vê o nada, é o mestre interior (aquilo a que
damos o nome de Deus). Só ele é; todo o restante parece ser. Ele é seu próprio
ser, sua esperança e segurança de liberdade: encontre-o e una-se a ele (isto
é, perceba-o), e estará a salvo e seguro” (‘... a Verdade vos libertará’).

A Libertação não é uma aquisição, mas uma questão de coragem; coragem de aceitar que você já é livre e de agir com base nisso”.

Pergunta: Mas pensar, racionalizar não é o estado normal da mente? A mente pode parar de trabalhar, de funcionar?

Nisargadatta Maharaj - Pode ser o seu estado habitual, mas isso será sempre o seu estado normal? Um estado normal não é doloroso enquanto que o habitual quase sempre leva à dor e ao sofrimento.

Pergunta: Se esse não é o estado natural ou normal da mente, como cessá-lo? Deve haver uma forma de aquietar a mente. Quantas vezes digo a mim mesmo: ‘por favor, pára, chega deste falatório sem fim, de frases repetidas vezes sem conta!’ Mas a minha mente não pára. Sinto que é possível pará-la um pouco, mas não por muito tempo. Até mesmo os assim chamados "espirituais" usam artimanhas para manter as suas mentes quietas. Eles repetem fórmulas, cantam, rezam, fazem respiração forçada ou suave, giram, concentram-se, meditam, buscam transes, cultivam virtudes - trabalham o tempo todo de forma a pararem de trabalhar, pararem de procurar, pararem de se mover (para que a mente pare de operar). Quando isso não é trágico, é ridículo.

Nisargadatta -  A mente existe em dois estados: enquanto água e enquanto mel. A água vibra ao mínimo distúrbio enquanto que o mel, embora perturbado, retorna rapidamente à imobilidade.

Pergunta: Pela sua natureza a mente é agitada. Talvez ela possa ser aquietada, mas não é quieta por si mesma, não é isso?

Nisargadatta: Quando tens febre, tremes a toda a hora. São os desejos e os medos (a febre) que fazem a mente inquieta (trêmula). Livre de todas essas emoções a mente fica quieta.

Pergunta: Sim, às vezes sinto isso. Mas sempre que a sensação de perigo se instala, eu me sinto isolado, à parte de todas as relações com os outros. Você entende? É aqui que está a diferença entre as nossas mentalidades. Na mentalidade hindu, a emoção segue o pensamento. Dê a um hindu uma idéia e as suas emoções afloram. Com um ocidental é o oposto: dê-lhe uma emoção e ele irá produzir muitas idéias. As suas idéias são muito atrativas intelectualmente, mas emocionalmente não.


Nisargadatta - Coloca o teu intelecto à parte. Não o uses nestes assuntos (isto é, esqueça o ‘eu’).

Pergunta: De que serve um conselho se não podemos lhe dar continuidade (se não podemos aplicá-lo corretamente)? Tudo isto são idéias e você quer que eu não responda emotivamente às idéias. Sem emoção, como pode haver ação?


Nisaragadatta - Por que falas em ação? Alguma vez ages por conta própria? Algum poder desconhecido age e tu imaginas que és tu que estás a agir. Tu estás meramente a ver o que acontece sem poderes influenciar em nada (és apenas testemunha).

Pergunta: Por que há uma resistência tão grande em mim para a aceitação de que não posso fazer nada, de que não decido nem escolho?
Nisargadatta - Mas, que podes tu fazer? Tu és como um paciente sob anestesia no qual o cirurgião faz uma cirurgia. Quando acordas vês que a operação terminou; podes dizer que fizeste alguma coisa?

Pergunta: Mas fui eu que escolhi submeter-me à cirurgia.

Nisargadatta - Claro que não. Foi a tua doença, por um lado, e a pressão do teu médico e da família, por outro, que te fizeram, aparentemente, decidir. Não tens escolha alguma; apenas a ilusão de que escolhes, de que tu decides; não há escolha.

Pergunta: No entanto, não me sinto tão indefeso quanto você faz parecer. Sinto que posso fazer tudo aquilo que penso; só não sei como fazer. Não é o poder que me falta, é o conhecimento.


Nisargadatta - Não conhecer os meios para fazer é admitido como sendo tão mau quanto não ter o poder! Mas deixemos este assunto por agora; afinal, não é importante o motivo pelo qual nos sentimos indefesos, mas sim que consigamos ver claramente que neste momento somos indefesos.

Eu tenho agora 74 anos e, no entanto, me sinto como se fosse uma criança. Eu sinto claramente que apesar de todas as mudanças eu sou uma criança. O meu Guru disse-me: essa criança, que és tu neste exato momento, é o teu verdadeiro eu. Volta a esse estado de puro ser, onde o "Eu sou" ainda está na sua pureza antes de ter sido contaminado e confundido com "eu sou isto" ou "eu sou aquilo". O teu fardo (os teus problemas) é de falsas identificações - abandona-as todas. O meu Guru disse: "Confia em mim. Eu te digo: tu és divino.
Toma isto como verdade absoluta. A tua alegria é divina, o teu sofrimento também é divino. Tudo vem de Deus. Lembra-te sempre: Tu és Deus, e sempre é feita a tua vontade." Eu acreditei nele e rapidamente realizei o quão as suas palavras eram verdadeiras e certas. 

Não condicionei a minha mente pensando: "Eu sou Deus, eu sou maravilhoso, eu estou além." Simplesmente segui a sua instrução que era focar a mente no puro "Eu sou" e ficar aí. Eu costumava sentar-me durante horas seguidas com nada exceto o "Eu sou" na minha mente e, cedo, a paz e a alegria e um amor profundo e envolvente tornaram-se o meu estado normal. Nisso, tudo desapareceu - eu, o meu Guru, a vida que vivia, o mundo à minha volta. 
Apenas a paz se manteve envolta por um silêncio incompreensível.

Pergunta: Parece tudo muito simples e fácil, mas não é. Às vezes acontece o maravilhoso estado de alegria e eu olho e penso: quão facilmente vem e quão parece íntimo e totalmente meu. Onde estava a necessidade de lutar tão fortemente por este estado que é tão próximo? Mas cedo esse estado se dissolve e deixa-me a pensar se teria sido realidade ou alguma ilusão. Se era realidade, por que se foi embora? Talvez seja necessária alguma experiência singular para se ficar nesse novo estado para sempre e, até que essa experiência crucial aconteça, este jogo de esconde-esconde vai continuando.

Nisargadatta - A tua expectativa de algo singular e dramático, de alguma explosão maravilhosa, está apenas a atrasar (é apenas obstáculo) a tua realização. Não é para esperares uma explosão, pois a explosão (esse milagre)
já aconteceu - no momento do teu nascimento, quando te realizaste como
sendo ser-conhecimento-sensação. Há apenas um erro que estás a fazer: tu tomas o dentro como sendo o fora e o fora como sendo o dentro. 


O que está em ti, tu tomas como estando fora de ti, e, o que está fora, tu tomas como estando dentro de ti (isto é, a tua interpretação sempre incorreta das coisas do mundo). 

A mente e os sentimentos são externos, mas tu os tomas como internos, íntimos. Tu acreditas que o mundo é objetivo, mas ele é inteiramente uma projeção da tua psique.
Essa é a confusão básica e nenhuma explosão a vai esclarecer. Tens de te pensar fora disso. Não há outra forma."
Nisargadatta Maharaj em I Am That




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