Pode-se olhar a vida sem os olhos do passado?
autoconhecimento

Pode-se olhar a vida sem os olhos do passado?


Vocês devem recusar, não apenas verbal, intelectual ou teoricamente, mas negar realmente tudo o que o homem tem dito. A cada um cabe descobrir, por si próprio, porque a Verdade não é coisa adquirível de outrem; tampouco está fixada num ponto. Compreendam, por favor, que precisamos ser verdadeiramente sérios, para rejeitarmos toda espécie de propaganda, pois religião (organizada) é uma contínua propaganda. Há mais de dois mil ou cinco mil anos lhes é dito o que devem fazer, o que devem pensar. Cumpre-lhes, pois, rejeitar tudo isso e descobrir por si mesmos o que é a Verdade, se tal coisa existe. Importa compreenderem a si mesmos, e não o que outros dizem sobre vocês. Se seguem um psicólogo, um filósofo, um analista, um intelectual ou um dos velhos instrutores, até dos mais antigos e venerados, etc., estão meramente seguindo o que eles dizem sobre vocês. Vocês têm, pois, de rejeitar tudo, para começarem a descobrir o que são.

Esse autodescobrimento faz parte da meditação, e é absolutamente necessário, porque, se não se conhecem, não apenas superficialmente, mas no mais profundo do ser de vocês, não terão nenhuma base para a ação, nenhum fundamento sobre o qual erguer um edifício estável, harmonioso. E ninguém senão vocês mesmos pode ensinar-lhes o que são; devem, pois, ser o guru, o discípulo, o mestre; o aprendizado de vocês deve vir de vocês. O que aprendem de outrem não é verdadeiro. Tratem, pois, de descobrir individualmente o que são e de aprender a se observarem.

Autoconhecimento não significa acumular conhecimentos sobre si mesmo; significa observar a si mesmo. Se aprendo acumulando conhecimentos, nada aprendo a respeito de mim mesmo.

Há duas maneiras de aprender. A primeira é aprender acumulando conhecimentos e, com eles, observar; isto é, observar através do crivo do passado. Observo-me, tenho experiências, acumulo conhecimentos derivados dessas experiências; olho-me através das experiências, isto é, olho-me mediante o passado. Essa é uma das maneiras de aprender. A outra maneira é observar o movimento de todos os pensamentos, de todos os “motivos”, e jamais acumular. Por conseguinte, este aprender é um processo constante.

Explicando melhor: vejo que sou violento; observo minha violência e a condeno. Condenando-a, aprendi que não deve existir violência. Na próxima ocasião em que me observo como pessoa violenta, reajo de acordo com o que aprendi. Por conseguinte, não há observação nova, porque estou olhando a nova experiência com “olhos velhos”, com o conhecimento anteriormente adquirido. Logo, não estou aprendendo. Aprender é um movimento constante, não oriundo do passado; um movimento de momento a momento, portanto, sem acumulação. Nós somos o resultado de milhares de anos de acumulação, e continuamos a acumular; e, se quiserem compreender essa acumulação, cumpre-lhes observá-la e deixar de acumular. Deve, pois, haver uma observação que seja um constante aprender sem acumulação. Acumulação é o “centro”, o “eu”, o “ego”; e, para compreendermos esse centro, devemos estar livres de toda espécie de acumulação; não, deixarmos de acumular num nível, para cumularmos noutro nível, com outro alvo.

Temos, pois, de a “aprender com o que somos”, observando-nos sem condenação, sem justificação, observando simplesmente nossa maneira de andar, de falar, as palavras que empregamos, os diferentes “motivos”, propósitos, intenções: estando totalmente vigilantes, sem escolha. E esse percebimento não significa acumulação, mas, sim, estar vigilante de instante em instante. Se, em qualquer momento, deixarem de estar vigilantes, não se preocupem: comecem novamente. Assim, a mente de vocês, está sempre nova. A auto-observação, pois, não se limita ao nível superficial, mas, penetra o nível mais profundo, o chamado “nível inconsciente”, “oculto”. Como observar uma coisa que se acha muito profundamente radicada, oculta, fechada? Nossa consciência é tanto superficial como oculta; e temos de reconhecer todo o conteúdo dessa consciência, uma vez que o conteúdo integra a consciência. Não são coisas separadas: o conteúdo é a consciência.

Por conseguinte, para se compreender o conteúdo deve haver observação sem o “observador”. Esta é uma das coisas mais fascinantes: descobrir como olhar a vida de maneira nova. Para observarmos o “oculto”, precisamos de olhos não condicionados pelo passado; não devemos ser hinduístas, cristãos, etc. Devemos olhar-nos cada vez como se fosse a primeira vez e, por conseguinte, sem acumular. Se puderem se observar dessa maneira, observar suas ações, seja no trabalho, seja no lar; observar seus apetites sexuais, suas ambições — observar sem condenar, sem justificar, observar simplesmente — verão que nessa observação não há conflito de nenhuma espécie. Mas, se observarem com uma mente torturada, deformada, jamais descobrirão o que é a verdade. Entretanto, em geral, nossa mente é deformada, torturada, degradada pelo controle, pela disciplina, pelo medo.

Jiddu Krishnamurti — Madras, 13 de janeiro de 1971





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