Os pais são cruéis com seus filhos porque têm um certo investimento neles. Os pais têm certas ambições que gostariam de satisfazer através de seus filhos — por isso são tão cruéis. Eles querem usar os filhos. No momento em que você quer usar alguém, fatalmente você será cruel. A própria ideia de usar alguém como meio, está permeada de crueldade, de violência.
Jamais trate outra pessoa como um meio! — porque cada pessoa é um fim em si mesma.
Os pais são cruéis porque estão cheios de ideias: querem que os filhos sejam isso e aquilo. Eles gostariam que os filhos fossem ricos, famosos, respeitados; gostariam que seus filhos satisfizessem os seus egos insatisfeitos. Os filhos se tornam sua viagem.
O pai queria ser rico mas não teve sucesso; e agora a morte está se aproximando; mais cedo ou mais tarde será eliminado da vida. Ele sente-se frustrado: ainda não alcançou o seu objetivo. Ele ainda estava tentando, buscando... e agora vem a morte — e isso parece tão injusto! Ele gostaria que o filho prosseguisse com o trabalho, porque o filho o representa. Ele é seu sangue, é sua projeção, é uma parte dele — é sua imortalidade. Quem conhece a alma? Ninguém a conhece com certeza. As pessoa acreditam, mas a crença nasce do medo, no fundo a dúvida permanece.
Cada crença carrega a dúvida dentro de si. Sem a dúvida não pode existir qualquer crença. Para reprimir a dúvida, nós criamos a crença — mas a dúvida permanece correndo o coração como uma lagarta corrói a maçã; ela o vai correndo por dentro, ela o vai apodrecendo por dentro. Quem conhece Deus e quem conhece a alma? Eles podem não existir.
A única imortalidade conhecida pelo homem é através dos filhos — isso é um fato. O pai sabe: "Eu estarei vivendo em meu filho. Eu estarei morto, em breve estarei sob a terra, mas meu filho estará aqui. E meus desejos permaneceram insatisfeitos". Ele impõe esses desejos, implanta esses desejos no inconsciente do filho: "Você tem que satisfazê-los. Se você os satisfizer, eu ficarei feliz. Se você os satisfizer, você estará pagando suas dívidas para com o seu pai. Se você não os satisfizer, você estará me traindo".
É por aí que a crueldade entra. Agora, o pai começa a moldar a criança de acordo com o seu desejo. Ele esquece que a criança tem sua própria alma, que a criança tem sua própria individualidade, que a criança tem seu próprio desenvolvimento interior que deve desabrochar. O pai impõe suas ideias. Ele começa a destruir a criança.
E ele pensa que a ama: ele ama somente a própria ambição. Ele ama o filho porque este vai se tornar um instrumento; o filho vai ser um meio. Isso é crueldade.
Você me pergunta: "Por que os pais são tão cruéis com seus filhos?"
Eles não podem mudar isso, porque têm ideias, ambições e desejos insatisfeitos. Eles querem satisfazê-los, querem continuar a viver através dos filhos. Naturalmente eles podam, eles cortam, eles moldam, eles dão um padrão para a criança. E as crianças são destruídas.
Essa destruição fatalmente acontece — a menos que um novo ser humano, que ame por amar, surja sobre a terra; a menos que uma nova paternidade, em que você ama a criança pela simples alegria de amar, em que você ama a criança como uma dádiva de Deus, seja concebida. Você ama a criança porque Deus foi tão... uma tamanha benção para você. Você ama a criança porque a criança é vida, um convidado que veio do desconhecido e que se aninhou em seu lar, em seu ser, que o escolheu como seu ninho. Você está grato e você ama a criança.
Se você realmente ama a criança, não dará as suas ideias para a criança. O amor jamais dá qualquer ideia, jamais dá qualquer ideologia. O amor dá liberdade. Você não o amoldará. Se o filho quiser se tornar um músico, você não tentará dissuadi-lo. E você sabe perfeitamente bem que ser músico não é o tipo de emprego mais indicado, que ele será pobre, que ele jamais se tornará muito rico, que ele jamais se tornará um Henry Ford. Ou a criança quer se tornar um poeta e você sabe que ele será apenas um mendigo. Você sabe disso! Mas você aceita isso porque respeita a criança!
O amor é sempre respeitoso. O amor é reverente. Você respeita! Porque se esse é o desejo de Deus a ser cumprido através de uma criança, então permita que assim seja. Você não interfere, você não se intromete no caminho. Você não diz: "Isso não está certo. Eu conheço melhor a vida, eu vivi a vida — você é apenas um ignorante, não conhece a vida e suas experiências. Eu sei o que significa ter dinheiro. A poesia não vai lhe dar dinheiro. É melhor que se torne um político, ou pelo menos se torne um engenheiro ou médico". E a criança quer se tornar um cortador de lenha, ou a criança quer se tornar um sapateiro, ou a criança simplesmente quer se tornar um vagabundo, e quer desfrutar a vida... descansar sob as árvores, nas praias do mar, vagar pelo mundo...
Se você ama, você não interfere; você diz: "Ok, vá com minhas bênçãos. Procure, busque a sua verdade. Seja tudo aquilo que deseja ser. Eu não vou ficar no seu caminho. E não vou incomodá-lo com minhas experiências — porque minhas experiências são minhas experiências. Você não é eu. Você pode ter vindo através de mim, mas você não é eu — você não é minha cópia. Você não deve ser uma cópia de mim. Você não deve me imitar. Eu vivi a minha vida — você viva a sua. Não vou sobrecarregá-lo com minhas experiências não vividas. Eu não vou sobrecarregá-lo com meus desejos não satisfeitos. Eu farei com que permaneça leve. E eu o auxiliarei — seja tudo aquilo que quiser ser, com todas as minhas bênçãos e com toda a minha ajuda".
Os filhos vêm através de vocês, mas eles pertencem a Deus, pertencem à totalidade. Não os possua. Não comece a pensar que eles lhes pertencem. Como podem lhe pertencer?
Uma vez que essa visão aflore em você, — então não haverá mais crueldade.
Você pergunta: "Por que os pais são tão cruéis com os filhos? Faz algum sentido responsabilizá-los?"
Não, eu não estou dizendo que faz qualquer sentido colocar a responsabilidade sobre os pais — porque eles sofreram por causa dos pais deles, e assim por diante... É necessário entender. Encontrar bodes expiatórios não é de qualquer ajuda. Você pode simplesmente dizer: "Eu estou destruído porque meus pais me destruíram — o que eu posso fazer?" Eu sei, os pais são destrutivos, mas se você se torna alerta e consciente, você pode sair do padrão que eles criaram e teceram à sua volta.
Você sempre é capaz de sair de qualquer armadinha que tenha sido armada à sua volta. A sua liberdade pode ter sido enjaulada, mas a liberdade é tal, é tão intrínseca, que não pode ser completamente destruída. Ela sempre permanece, e você pode encontrá-la novamente. Talvez seja difícil, árduo, duro, uma tarefa penosa, mas não é impossível.
Não faz sentido simplesmente jogar a responsabilidade sobre outros, porque isso o torna irresponsável. É justamente isso o que os psicanalistas freudianos têm feito às pessoas — esse é o seu mal. Você vai a um psicanalista e ele o faz sentir-se perfeitamente bem quando diz: "O que você pode fazer? Seus pais eram tais — sua mãe era isso, seu pai era aquilo, toda a sua criação foi errada. É por isso que você está sofrendo de todos esses problemas." Você se sente bem — agora não é mais responsável.
Durante dois mil anos o cristianismo tem feito você sentir-se responsável, sentir-se culpado, sentir-se um pecador. Agora a psicanálise vai para o outro extremo: simplesmente diz que você não é o pecador, que não precisa se sentir culpado — você está perfeitamente ok. Esqueça tudo a respeito de culpa e esqueça tudo a respeito de pecado. Os outros são responsáveis!
O cristianismo causou muitos danos ao criar a ideia de culpa — agora a psicoanálise está causando danos no outro extremo ao criar a ideia de irresponsabilidade.
Você deve se lembrar: os pais fizeram certas coisas porque foram ensinados a fazer certas coisas — os pais deles os haviam ensinado. Eles também foram educados por pais; eles não vieram diretamente do céu. Assim, qual é o sentido de jogar a responsabilidade para trás? Isso não ajuda; não ajudará a solucionar qualquer problema. Simplesmente o ajudará a se aliviar da culpa. Isso é bom, o lado bom; o lado benéfico da psicanálise é que ela o alivia da culpa. E o lado prejudicial é que ela o deixa ali, não o fazendo sentir-se responsável.
Sentir-se culpado é uma coisa; sentir-se responsável é outra coisa. Eu lhe ensino responsabilidade. O que quero dizer com responsabilidade? Você não é responsável por seus pais, você não é responsável para com Deus algum e você não é responsável para com qualquer sacerdote — você tem responsabilidade para com seu ser interior. Responsabilidade é liberdade! Responsabilidade é a ideia de que "Eu tenho que tomar as rédeas de minha vida em minhas próprias mãos. Já chega! Meus pais têm me prejudicado — tudo que eram capazes de fazer, fizeram: o bem e o mal, fizeram ambos. Agora me tornei uma pessoa madura. Eu deveria tomar tudo em minhas próprias mãos e começar a viver conforme as coisas forem surgindo dentro de mim. Eu deveria devotar toda a minha energia para minha vida agora". E imediatamente você se sentirá tomado por uma grande força.
OSHO