A verdadeira revolução - II
autoconhecimento

A verdadeira revolução - II


Em todas as nossas relações - com pessoas, com a natureza, com idéias, com coisas - parece que criamos cada vez mais problemas. Se tentamos resolver um problema - econômico, político, social, coletivo ou individual - fazemos surgir grande número de novos problemas. De algum modo, parece que criamos cada vez mais conflito, e estamos cada vez mais necessitados de reforma. É bem evidente que toda reforma torna necessárias novas reformas, sendo, por conseguinte, um verdadeiro retrocesso. Enquanto a revolução, seja da esquerda, seja da direita, for apenas a continuidade do que foi, em referência ao que será, ela também é retrocesso. Só pode haver uma revolução fundamental, uma constante transformação interior, quando nós, como indivíduos, compreendermos nossas relações com a coletividade. A revolução deve começar em cada um de nós, e não nas influências exteriores, nas influências ambientes. Nós, afinal, somos a, coletividade; tanto o nosso consciente, como o inconsciente são o resíduo de todas as influências políticas, sociais e culturais do homem. Por conseguinte, para se realizar, exteriormente, uma revolução fundamental, torna-se necessária uma transformação radical em nosso interior, uma transformação independente de qualquer modificação do ambiente. A revolução deve começar em vós e em mim. Todas as grandes coisas começam em escala pequena, todos os grandes movimentos começam em vós e em mim como indivíduos; e se esperamos pela ação coletiva, essa ação coletiva, se vem a realizar-se, é destrutiva e conducente a mais sofrimentos.

Vemos, pois, que a revolução deve começar, em vós e em mim. Essa revolução, essa transformação individual, só pode realizar-se quando compreendemos as nossas relações, que constituem o "processo" do autoconhecimento. Sem conhecer integralmente o "processo" das minhas relações, nos seus diferentes níveis, o que penso e o que faço nenhum valor têm. Que base tenho eu para pensar, se não conheço a mim, mesmo? Temos tanto desejo de agir, tanto empenho em fazer, alguma coisa, em realizar alguma espécie de revolução, alguma espécie de melhoria, alguma modificação no mundo; mas sem conhecermos o nosso próprio funcionamento (processo), tanto na periferia como no interior falta-nos toda base para a ação e o que fazemos não pode deixar de criar mais sofrimento e mais luta. A compreensão de nós mesmos não se consegue pelo processo de nos retirarmos da sociedade, ou de nos recolhermos a uma torre de marfim. Se vós e eu nos dedicarmos a estudar o assunto com toda a atenção e de maneira inteligente, veremos que só podemos compreender a nós mesmos em relação e não no isolamento. Ninguém pode viver no isolamento. Viver é estar em relação. É só no espelho das relações que compreendo a mim mesmo - o que significa que devo estar sempre sobremodo atento, em todos os meus pensamentos, sentimentos e ações, na vida de relação. Não constitui isso um processo difícil nem empresa sobre-humana; e, como acontece com todos os rios, se bem que a nascente seja quase imperceptível, as águas vão ganhando ímpeto, no seu curso, à medida que se vão aprofundando. Se, neste mundo louco e caótico, vos empenhardes naquele processo, avisadamente, com atenção, e com paciência, sem condenar, vereis como ele começa a ganhar ímpeto, independentemente da questão de tempo.
A verdade existe minuto por minuto, na vida de relação, e temos de vê-la em cada ato, cada pensamento e cada sentimento que surge, em nossas relações. A verdade não é coisa que se possa acumular, armazenar; temos de achá-la de novo, no pensamento e no sentimento, a cada instante - o que não representa um processo acumulativo e, por conseguinte, não depende do tempo. Quando dizeis que, com o tempo, compreendereis, graças à experiência ou ao saber, estais justamente impedindo a compreensão, porque esta não resulta de acumulação alguma. Podeis acumular saber, mas isso não é compreensão. A compreensão surge quando a mente está livre do conhecimento. Quando a mente não exige a satisfação de desejos, quando não procura experiência, há tranqüilidade; e quando a mente está tranqüila, só então haverá compreensão. Só quando vós e eu estamos verdadeiramente dispostos a ver claramente as coisas tais como são, é que se nos oferece a possibilidade de compreensão. A compreensão vem, não por meio de disciplinamento, não por meio da compulsão, de coerção, mas, sim, quando a mente está tranqüila e disposta a ver as coisas com lucidez. A serenidade da mente nunca se pode conseguir por meio da compulsão, sob qualquer forma, consciente ou inconsciente; tem de ser espontânea. A liberdade não está no fim, mas no começo; porque o fim e o começo não são diferentes, o meio e o fim são idênticos. O começo da sabedoria é a compreensão do processo total de nós mesmos, e esse autoconhecimento, essa compreensão, é meditação.

Krishnamurti - Madrasta, 5 de fevereiro de 1950
Do livro: Que estamos buscando? - ICK




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