O correto caminho da meditação
autoconhecimento

O correto caminho da meditação


Interrogante: Em que, em sua opinião, consiste a verdadeira meditação?

Krishnamurti: vejamos, qual o objetivo da meditação? E o que queremos dizer com meditação? Não sei se vocês alguma vez já meditaram mas vamos descobrir juntos em que consiste a verdadeira meditação? Não se atenham à minha forma de expressá-lo; juntos descobriremos e experimentaremos o que é a verdadeira meditação. Porque meditar é importante, não é? Se vocês não sabem o que é meditação correta não existe autoconhecimento, e sem conhecerem a si mesmos, a meditação não tem sentido. Sentar-se num canto, andar pelo jardim ou pela rua, tentando meditar, não tem sentido. Isso só leva a um tipo de concentração peculiar que é a exclusão. Tenho certeza de que vocês tentaram todos esses métodos. Isto é, tentam se concentrar num determinado objeto, tentam forçar a mente, quando ela está divagando, para que se concentre e, quando isso falha, oram.

Se queremos realmente entender a meditação correta, precisamos descobrir quais as coisas falsas às quais demos o nome de meditação. É óbvio que concentração não é meditação porque, se vocês observarem, no processo de concentração existe exclusão e, portanto, distração. Vocês estão tentando se concentrar em algo e sua mente divaga em outra direção, ocorrendo uma constante batalha para a fixação num ponto, enquanto a mente se recusa e foge. De forma que levamos anos tentando nos concentrar, aprendendo a nos concentrar, o que chamamos erroneamente de meditação.
Existe, também, o problema da oração. A oração, obviamente, produz resultados, pois, de outro modo, milhões não orariam. Na oração, é claro, a mente se aquieta; pela constante repetição de certas frases, a mente realmente se aquieta. Nessa quietude surgem certas sugestões, certas percepções, certas respostas. Isso, entretanto, ainda constitui uma parte dos truques da mente, porque, afinal de contas, por meio de uma espécie de hipnotismo, você pode fazer com que sua mente fique muito quieta. E nessa quietude ocultam-se certas respostas, certas reações que nascem de inconsciente e da consciência exterior. Mas é ainda um estado em que não existe entendimento.

E meditação não é devoção — devoção a uma ideia, a um ídolo, a um princípio — porque as coisas da mente são ainda idolatria. Não podemos adorar uma estátua — considerando isso idolatria, tolice, superstição —, mas muita gente idolatra as coisas da mente. Isso é também idolatria. Devotar-se a um ídolo ou a uma ideia, a um Mestre, não é meditação. É óbvio que se trata de uma forma de fugir de si mesmo. Uma fuga muito reconfortante, mas ainda assim uma fuga.

Esta eterna luta para tornar-se virtuoso, para chegar à virtude por meio da disciplina, de cuidadosa auto-análise, e assim por diante, também não é, obviamente, meditação. Muitos de nós somos conduzidos por esses processos, mas considerando que eles não proporcionam o conhecimento de nós mesmos, não são a forma correta de meditação. Afinal de contas, sem conhecer-nos a nós mesmos, que base possuímos, para um correto pensar? Tudo o que vocês farão sem o conhecimento de si mesmos é conformarem-se com os antecedentes, sem as respostas de seu condicionamento. Mas, estar consciente dessas respostas, isto é, estar ciente dos movimentos da mente e dos sentimentos, sem qualquer senso de condenação, de modo que os movimentos do self, as formas do self, sejam completamente entendidas, é o caminho da correta meditação.  

Meditação não é afastamento da vida. Meditação é um processo de conhecer-se a si mesmo. E quando começamos a conhecer-nos, não somente o consciente, mas também todas as áreas ocultas de nosso ser, nasce a tranquilidade. Uma mente forçada a ficar quieta através da meditação, de compulsão, de submissão não é uma mente quieta: é uma mente estagnada. Não é uma mente alerta, passiva, capaz de receptividade criativa. Meditação demanda constante estado de vigilância, constante percepção de cada palavra, de cada pensamento, de cada sentimento, o que revela o estado de nosso próprio ser, tanto o aparente como o oculto. Como isso é penoso, escapamos para todos os tipos de coisas consoladoras e ilusórias e damos-lhes o nome de meditação.

Se pudermos compreender que no autoconhecimento reside o começo da meditação, então o problema se torna extraordinariamente interessante e vital. Porque, sem autoconhecimento, vocês podem praticar o que chamam de meditação e ainda estarem apegados a seus princípios, às suas famílias, às suas propriedades, vocês podem ainda estar arraigados a uma ideia e tão concentrados nela que a alimentam mais e mais. Isso, claro, não é meditação. E, à medida que nos aprofundamos cada vez mais na questão do autoconhecimento, não só a mente superior se torna tranquila, quieta, como as diferentes camadas ocultas transparecem. Quando a mete superficial está quieta, então o inconsciente, as camadas ocultas da consciência se projetam, revelando seu conteúdo, transmitindo suas sugestões de forma que o processo global de nosso ser passa a ser totalmente entendido.

Então a mente se torna sumamente quieta — é quieta; não a tornaram quieta, não a obrigaram a ficar quieta, por medo ou por recompensa. Nasce depois um silêncio no qual se concretiza a realidade. Esse silêncio não é um silêncio cristão, ou budista, ou hindu. Esse silêncio é silêncio, sem qualificações. Se vocês seguirem a trilha do silêncio cristão, ou budista ou hindu, jamais serão silenciosos. Para descobrir a realidade, o homem precisa abandonar por completo seus condicionamentos sejam eles cristão, budistas, hindus ou pertencentes a qualquer outra categoria. Meramente fortalecer o passado, por meio da meditação, de submissão, acarreta a estagnação da mente, a chatice mental e chego a desconfiar que é isso o que muitos de nós desejam porque é muito mais fácil criar um padrão e segui-lo.  Mas libertar-se do passado requer um constante estado de alerta nas relações.

Uma vez que se instaure esse silêncio, existirá um extraordinário estado criativo — não que vocês tenham que escrever poesias, pintar quadros — isso vocês podem fazer ou não. Mas esse silêncio não deve ser procurado, copiado, imitado — porque cessa de ser silêncio. Vocês não podem chegar a ele por nenhum caminho. Ele se concretiza somente quando são entendidos os caminhos do self e quando o self, com toda a sua inquietude e novicidade, chega ao fim. Isto é, quando a mente deixa de criar, nasce a criação.

Por conseguinte, a mente precisa tornar-se muito simples, muito quieta; ela precisa ser quieta — o uso da palavra “precisa” está errado; dizer que a mente precisa estar quieta subentende compulsão — e a mente torna-se quieta somente quando todo o processo do self chega ao fim. Quando todas as formas do self forem entendidas e quando toda a inquietude do self cessar, somente então haverá silêncio. Esse silêncio é a verdadeira meditação. E nesse silêncio a eternidade se concretiza. 

Krishnamurti — extraído da 4ª palestra proferida em Londres em 23 de outubro de 1949    




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