Qualquer coisa é melhor do que a verdade
autoconhecimento

Qualquer coisa é melhor do que a verdade


A experiência nos ensina que temos apenas uma única arma duradoura na luta contra as doenças mentais: a descoberta e a aceitação da história, única e específica, de nossa infância. É possível nos libertarmos totalmente das ilusões? Toda e qualquer vida é cheia de ilusões, talvez porque a verdade nos pareça insuportável. Mesmo assim, a verdade nos é tão essencial, que o preço por sua perda é adoecer gravemente. Dessa forma, procuramos descobrir, por meio de um longo processo, nossa verdade pessoal, aquela que, antes de nos brindar com um novo nível de liberdade, dói continuamente — a menos que nos contentemos com um reconhecimento intelectual. O que nos faz permanecer na esfera da ilusão. 

Não podemos mudar em nada nosso passado, não podemos desfazer os males que foram imputados na infância. Mas podemos nos mudar, "consertar", reconquistar nossa integridade perdida. Isso é possível à medida que decidimos observar mais de perto o conhecimento sobre o passado arquivado em nosso corpo, e colocá-lo mais perto de nossa consciência. Certamente, é um caminho desconfortável, mas é o único que nos oferece a possibilidade de, finalmente, deixar a invisível (e ao mesmo tempo cruel) prisão da infância, nos transformando de vítimas inconscientes do passado em pessoas responsáveis, que são cientes de sua história e, com isso, capazes de conviver com ela. 

A maior parte das pessoas faz exatamente o contrário. Não quer saber nada de sua história e, dessa forma, não sabe que, no fundo, é continuamente determinada por essa história, pois vive situações não-resolvidas, reprimidas na infância. Não sabe o que teme e evita perigos que um dia foram reais, mas que hoje não existem mais. Essas pessoas são impulsionadas por lembranças e necessidades inconscientes que, frequentemente, determinam de maneira mais perversa quase tudo o que fazem ou falhem no seu fazer — enquanto permanecerem inconscientes e não-resolvidas.

A repressão aos maus-tratos sofridos no passado leva algumas pessoas, por exemplo, a destruir a própria vida e a vida de outros, incendiar casas de estrangeiros, promover vinganças, tudo em nome de um "patriotismo", a fim de ocultar a verdade de si mesmas e sentimentos de desespero de uma criança torturada. Outras reproduzem ativamente o sofrimento a que foram submetidas, em clubes de flageladores, em cultos a sacrifícios de todos os tipos, no mundo sadomasoquista, chamando a tudo de libertação. As mulheres furam seus mamilos para pendurar brincos, posam para jornais e contam, orgulhosas, que não sentiram dor e que se divertiram com isso. Não há do que duvidar nessas informações, pois essas mulheres tiveram de aprender muito cedo a perder a sensibilidade. E o que não fariam hoje em dia para não sentir a dor da garotinha que sofreu abuso sexual pelo seu próprio pai, e precisou imaginar que o atentado fora prazeroso? Uma mulher que sofreu abuso sexual quando criança, que negou a realidade de sua infância, está constantemente fugindo dos acontecimentos passados — com a ajuda de amantes, álcool, drogas ou ações excepcionais. Ela precisa estar continuamente "ligada", a fim de não sucumbir ao "tédio", não pode se permitir um segundo de tranquilidade, quando seria possível sentir a ardente solidão da realidade de sua infância, pois teme esse sentimento mais do que a morte — a menos que tivesse a sorte de aprender que o reavivamento  e a consciência dos sentimentos da infância, não matam, libertam. O que não raro mata é reprimir os sentimentos, cuja experimentação consciente poderia nos revelar a verdade.

Durante a infância, Michael sofreu  constante abuso
de seu pai, que o batia frequentemente e o aterrorizava
psicologicamente. Os ensaios eram supervisionados
pelo pai com um cinto na mão.  
A repressão dos sofrimentos da infância determina não só a vida do indivíduo como também os tabus da sociedade. Conhecidas biografias ilustram isso de maneira muito clara. Ao ler a biografia de artistas famosos, por exemplo, notamos que suas vidas começam em algum ponto da puberdade. Antes disso, o artista teve uma infância "feliz" ou "sem preocupações", ou ainda, "cheia de privações" ou "muito estimulante", mas o modo como a infância de cada um transcorreu parece ser de absoluto desinteresse.  Como se na infância não estivessem escondidas as raízes da vida toda. Gostaria de ilustrar o fato com um exemplo simples.

Em suas memórias, Henry Moore escreveu que, quando menino, podia massagear as costas de sua mãe com óleo para reumatismo. Ao encontrar essa passagem no livro, subitamente, fiz uma leitura muito pessoal das obras de Morre: mulheres grandes, reclinadas, de cabeças pequenas — nelas vi a mãe pelos olhos do garoto, cuja perspectiva diminuía a cabeça e percebia como imensas as costas próximas. Isso pode ser irrelevante para os críticos de arte. Mas, para mim, é um indício de quão fortemente as experiências de uma criança podem se conservar no inconsciente, e que possibilidades de expressão podem despertar quando o adulto está livre para admiti-las.

Nesse caso, a lembrança de Moore não era nociva e pôde sobreviver intacta. Mas todas as experiências traumáticas da infância permanecem no escuro. Nesse escuro ficam também escondidas as chaves para a compreensão da vida posterior.

Alice Miller em, O drama da criança bem dotada: como os pais podem formar (e deformar) a vida emocional dos filhos 




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