Interrogante: Fale-nos sobre Deus.
Krishnamurti: Em vez de eu lhes dizer o que é Deus, vamos ver se vocês podem conceber esse estado maravilhoso, não no amanhã ou num futuro distante, mas agora, neste momento em que estamos aqui tranquilamente reunidos. Claro que isso é mais importante. Mas, para descobrir Deus, todas as crenças devem ser abolidas. A mente que poderia descobrir, não pode acreditar na verdade, não pode formular teorias ou hipóteses a respeito de Deus. Por favor, prestem atenção. Vocês formulam hipóteses, vocês têm crenças, vocês têm dogmas, estão cheios de conjecturas. Pelo fato de terem lido este ou aquele livro a respeito do que é a verdade ou do que é Deus, suas mentes estão espantosamente inquietas. Uma mente cheia de conhecimentos é uma mente inquieta; é intranquila, está apenas sobrecarregada e carga pura e simples não é sinal de uma mente tranquila. Quando a mente está cheia de crenças, acreditando ou não que Deus existe, ela está sobrecarregada e uma mente sobrecarregada não pode jamais descobrir o que é a verdade. Para descobrir a verdade, a mente precisa estar livre, livre de rituais, de crenças, de dogmas, de conhecimentos e de experiência. Somente então ela poderá compreender o que é a verdade. Pelo fato de tal mente estar inquieta, ela não mais realiza o movimento de entrar ou o movimento de sair, que é o movimento do desejo. Ela não possui desejos reprimidos, o que é energia. Pelo contrário, para que a mente esteja quieta é preciso haver uma grande quantidade de energia; mas não pode haver pleno desenvolvimento ou abundância de energia se existir qualquer movimento para fora e, por conseguinte, de movimento para dentro. Quando tudo isso tiver serenado, a mente se quietará.
Eu não estou tentando hipnotizá-los para que vocês fiquem quietos, para que vocês se calem. Vocês mesmos precisam reconhecer a importância de abandonar, de afastar sem esforço, sem resistência, todo o acúmulo de séculos, de superstições, de conhecimentos, de crenças; precisam reconhecer que qualquer forma de carga torna a mente inquieta, dissipa energia. Para a mente estar quieta é preciso energia em abundância, e essa energia precisa estar tranquila. E se você chegarem realmente a esse estado no qual não existe esforço, então constatarão que a energia, estando imóvel, possui seu próprio movimento, o qual não resulta das pressões ou compulsões sociais. Pelo fato de a mente possuir uma energia abundante, imóvel e silenciosa, a própria mente se transforma naquilo que é sublime. Não existe experimentador do sublime: não existe alguém que diga “eu experimentei a realidade”. Enquanto houver um experimentador, a realidade não pode existir, porque o experimentador equivale ao movimento de angariar experiência e de acabar com a experiência. De forma que é preciso que o experimentador deixe totalmente de existir.
Atente simplesmente a isto. Não façam nenhum esforço, apenas compreendam que o experimentador tem que chegar ao fim. É preciso que ocorra a cessação total de todo movimento e isso demanda, não a supressão de energia, mas uma energia espantosa. Quando a mente estiver completamente quieta, calada, isto é, quando a energia não estiver sendo nem dissipada nem distorcida por obra da disciplina, essa energia se transformará em amor e o real não estará apartado da própria energia.
Krishnamurti — Sobre Deus — Ed. Cultrix