A prática da Presença
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A prática da Presença


Estava aqui meditando sobre a questão da minha antiga recusa anterior na pratica da "observação", na pratica do “testemunhar” desse estado de Presença Interna, de prestar atenção ao Sopro que me anima. Essa recusa era natural, visto que nunca fui ensinado sobre isso, nunca fui incentivado a isso; a idéia da relação com alguma força, com algum Poder, com algum Deus, era sempre no nível externo, nunca algo que pudesse ocorrer no ser que sou, em meu interior. Antes da depressão iniciática, pensar sobre isso, nem pensar. Naquela época, o lance era a busca de prazer, sucesso e reconhecimento. Desculpe o exemplo, mas era bem assim que as coisas funcionavam: só quando a “água batia na bunda” é que eu saía “na correria” atrás de algum “Deus Neves, o deus do papel higiênico”, aquele tipo de Deus que a maioria procura para limpar o resultado de suas próprias presepadas. Claro que nunca senti nada durante esse período.
Bem mais tarde, através do contato com as observações de Jiddu Krishnamurti, “viciei-me” no observador. Comecei a dissecar tudo através de uma observação, que em muitas vezes era profundamente ácida. Muito antes disso, já havia tomado contato com a experiência de alguns homens que exercitavam a prática da Presença, mas, seus dizeres me pareciam muito carregados de religiosidade e de uma mística que, para o meu intelecto, estava muito alto, algo totalmente inacessível (isso quando não tirava como uma verdadeira viagem, devido ao meu racionalismo cartesiano). Mas lá no fundo, apesar de todo conhecimento, apesar de todo “poder de observação”, o vazio, a insatisfação, o tédio, a inquietude, a incapacidade de permanecer parado, sem nada fazer, permanecia em constante ebulição. Era justamente por causa dessa insatisfação crônica que vivia pulando de livro em livro, de site em site, de rede social em rede social. Não tinha consciência de como estava "viciado" em buscar material que pudesse me ajudar na compreensão da mente, na observação da mente. Por mais que lesse sobre “O Poder do Silêncio”, a prática do “Eu sou”, não conseguia “acreditar” que pelo observar do meu estado interior, pelo sentar com meu estado de ser, pudesse de algum modo se mostrar funcional. Tinha em mente que qualquer coisa poderia ser melhor e surtir mais efeito do que me sentar e prestar atenção ao sopro que me anima; não via lógica em “ficar no Ser”, uma vez que a única coisa que sentia eram aqueles terríveis sentimentos inquietantes provenientes de meu vazio interior. Não conseguia ver que aquele vazio era um ótimo sinal, um sinal de que tudo aquilo que havia lido, tudo aquilo que havia buscado estava cumprindo seu devido papel de me esvaziar para poder chegar no estado propicio para a percepção de minha real natureza, desta Presença que me habita e no qual sou.
Lembro-me que, no inicio de meu contato com Nisargadata, fiquei maravilhado com sua amorosidade. Entrei de cabeça na leitura de seu livro. No entanto, senti que a leitura estava ficando “muito alta”, muito mística para o meu gosto, ou melhor, para o gosto do meu intelecto racional, o qual me pedia por uma leitura “mais pé no chão” (o mesmo se deu com Mojji e Ramana). E o que consegui com isso? Nada além de permanecer na conhecida horizontalidade inquietante, sem nada saber por experiência própria sobre a verticalidade do Ser, verticalidade esta que qualifica toda horizontalidade. Qualquer leitura “mais alta” me causava uma espécie de vertigem, uma síndrome de abstinência da presença do observador. Eu era profundamente viciado nesse observador livresco/internético. Quando cansava de me observar, observava o outro; vivia num “estado de medição” e desacreditava por completo que esse lance de Presença pudesse ser uma realidade. Inclusive, carregava a idéia, uma imagem de como “deveriam ser, fisicamente, os tais seres iluminados” (que viagem). Se o “Guru” não fosse dentro do perfil da imagem criada, não era digno sequer de terem lidas duas ou três páginas de seus escritos.
Hoje, entendo que não tinha nada de errado nisso: é uma reação profundamente natural, uma vez que o intelecto não consegue sair do tempo, do espaço, da lógica, da razão, do conhecido, de seu enorme arquivo de imagens, com seu processo de medição separatista e fragmentadora. Como pode ele imaginar algo que não faça parte de nenhuma dessas limitadas esferas? Como vim a perceber, tudo que o intelecto não compreende, rotula ou mistifica. Essas sempre foram minhas duas únicas opções, sempre seguidas de suas tristes variantes. Hoje, ao observar o comportamento resistente de outros “aspirantes a observadores” e outros “observadores guardiões de limiar", rio muito de meu antigo comportamento dotado de uma rebeldia desinteligente. Não havia outro modo de ser. Enquanto não há um "desarme" de toda essa estrutura, desarme esse que não é fruto da ação da mente, não há como. Não tem como se abrir para essa Presença, não há como sentir essa Presença, sem que ela mesma se dê a conhecer. Com isso em mente e coração, lhe pergunto:
“Como é que possível se sentar para sentir algo que você não sente?”
“Como você pode sentir falta do sabor de algo que você nunca provou?”
“É possível sentir o gosto de algo que você nunca provou, apenas olhando para uma foto?”
"Pode-se deliciar um bolo apenas admirando sua receita num papel?"
Pois era mais ou menos isso que eu tentava fazer e, é claro, de modo algum podia se mostrar eficiente, funcional. Eu bem que tentava buscar pelo “Eu Sou”, mas, devido minha louca ansiedade, isso não passava de dez ou quinze minutos, sempre substituídos por horas e horas de pesquisas, leituras e mais leituras e estudos de filmes. Eu tinha enraizado que seria através da leitura, do estudo que aquilo que eu tinha lido a respeito de outros, poderia também ocorrer comigo e, detalhe, através dos meus esforços. Não conseguia ir para qualquer lugar sem carregar comigo um ou dois livros (se um não desse a liga, corria para o outro). E foi assim, até que aconteceu algo que não tenho como explicar, e que já tentei relatar de forma extremamente limitada em textos anteriores.
Talvez você esteja se perguntando agora: e o que mudou?
Bem, posso lhe dizer que, só por agora, aquela fome literária, aquela busca de respostas, aquele excesso de perguntas, não existe mais. O que ocorre é a necessidade de ficar só, em silêncio, prestando atenção a este Sopro caloroso que me habita, e no qual sou. Há uma necessidade de natureza. Já não sinto a necessidade de recorrer na busca de filmes e documentários que possam me proporcionar aquele “click”, aquele “eureka”, aquele “Ah! É isso!” Sinto que posso assim lhe dizer: encontrei um livro bem no centro de meu peito. Encontrei uma enorme rede bem no centro de meu peito, encontrei um belo filme, bem aqui da onde se faz o Sopro. E é uma maravilha, uma delicia me sentar para ir vendo os movimentos das páginas que se apresentam (sem meu esforço e participação). Algumas delas são tão belas, que não consigo resistir ao impulso de com você compartilhar por meio de textos como este. Estar com Isto, estar na Presença Disto é algo que não tem como ser explicado por meio da limitação das palavras. E mesmo que fosse possível, a limitação do intelecto não permitiria. De que jeito? Como que alguém que sempre foi rei, se permitiria perder sua realeza diante da única “Coisa” que é real? Como? Quer mesmo saber?... Simples:
Renda-se!
Abra mão de suas drogas, abra mão de seu vício... 
Experimente... 
Permita-se... 
E, na melhor das palavras:
(...)
Relaxe e goze!
Que a Presença, seja, em sua excelência, neste terno agora!

Outsider




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