Aparte: Podeis falar-nos um pouco mais sobre o que é o amor?
Krishnamurti: Isto supõe duas coisas, não? — a definição verbal, de acordo com o dicionário, a qual, evidentemente, não é o amor. Essa é a primeira coisa, que envolve todos os símbolos, as palavras, as ideias, concernentes ao amor. A outra coisa é que só se pode encontrar o amor por meio da negação; ele só pode ser descoberto pela negação. E, para descobrir, a mente deve primeiramente libertar-se da escravidão das palavras, ideias e símbolos. Isto é, para descobrir o amor, a mente precisa varrer tudo o que já sabe a respeito do amor. Não é necessário “varrer” tudo o que é conhecido para se descobrir “o desconhecido?” Não é necessário varremos todas as nossas ideias, por mais que nos deleitem, todas as nossas tradições, por mais nobres que sejam, para descobrir o que é Deus, descobrir se Deus existe? Deus, aquela imensidão, deve ser incognoscível, não mensurável pela mente. Assim, precisamos cortar completamente o processo de medição, de comparação, e o processo de reconhecimento, para podermos descobrir.
Do mesmo modo, para saber, experimentar, sentir o que é o amor, a mente deve estar livre para descobri-lo; estar livre para senti-lo, para “viver com ele”, sem divisão entre observador e coisa observada. Precisa ultrapassar as limitações da palavra; perceber tudo o que a palavra sugere: amor pecaminoso e amor divino; amor nobre e amor ignóbil — todos os preceitos e sanções e tabus sociais com que temos cercado esta palavra. E isso representa empreendimento dificílimo, não? — amar um comunista, amar a morte. E o amor não é oposto do ódio, porque todo oposto é parte de outro oposto. Amar, compreender a brutalidade que impera no mundo, a brutalidade dos ricos e dos poderosos; ver o sorriso no rosto do pobre por quem passais na estrada e participar da felicidade dessa pessoa — experimentai isso uma vez, para verdes o que sucede. Amar requer uma mente que esteja sempre a purificar-se das coisas que conhece, que experimentou, recolheu, acumulou, e às quais se apegou. Sendo assim, não há possibilidade de descrever essa palavra; só podemos sentí-la em sua totalidade.
Krishnamurti — 28/05/1961