autoconhecimento
O que é o pensamento e como controlá-lo?
Agora, o interrogante deseja saber como se controla o pensamento. Primeiramente, para que você possa controlá-lo, você precisa saber o que é o pensamento e quem é o agente que controlador. Eles dois representam, processos distintos ou um fenômeno único? Você precisa, primeiro, compreender o que é o pensamento, para poder dizer "quero controlar o pensamento", e precisa, também,
conhecer o "controlador. Existe controlador sem o pensamento? Se você não tem pensamento, existe pensante? O pensante é o pensamento; o pensamento não está separado do pensante; ambos constituem um processo único.
Assim, pois, restam-nos apenas pensamentos, tendo desaparecido o pensante. Embora você pronuncie as palavras "eu penso", isso representa apenas uma forma de comunicação. O que há realmente é apenas um estado, no qual existe pensamento. E o pensamento cria o pensante, o qual, então, comunica o seu pensamento. O pensante é, meramente, a "verbalização" do pensamento.
Cabe a nós, pois, verificar o que é pensamento. Saberemos, então, se é ou não possível controlá-lo, e porque você deseja controlá-lo. Pode existir um critério inteiramente diferente para se colocar fim ao processo do pensamento, mas não é por meio de controle. Porque, no momento em que você exerce controle, em que faz um esforço de vontade, você não compreende o pensamento. Está, então, simplesmente, a condenar um pensamento e a justificar outro. Aquele que justificou, você deseja conservar, e aquele que condenou, deseja rejeitar. Vejamos, pois, o que se entende por pensamento.
O que é pensamento? Sem memória não há pensamento, há? O pensamento é o resultado de experiência acumulada, que é o passado, não é? Sem o passado não pode haver pensamento no presente, ou pode? O pensamento, pois, é uma reação do passado ao desejo do presente. Isto é, o pensamento, indubitavelmente, é reação da memória. Mas, o que é a memória? A memória, a conservação da lembrança, é a verbalização da experiência, não é verdade? Há desafio e reação — o que significa experiência — e essa experiência é verbalizada. Essa verbalização cria a memória; e a reação da memória ao desafio é o pensamento. Portanto, o pensamento é verbalização, não é?
Não sei se você já tentou pensar sem palavras. No momento em que você pensa, necessita de palavras. Não quero dizer que não haja um estado no qual não exista verbalização. Não estamos discorrendo a esse respeito. O pensamento é a palavra. Sem a verbalização, sem a palavra, o pensamento — o pensamento que nós conhecemos — não existe. Se você perceber, pois, que a palavra — a verbalização — é o processo do pensamento, não se trata então de controlar o pensamento, mas sim de fazer desaparecer o pensamento como "verbalização". Sempre que há verbalização de uma experiência, existe, forçosamente, pensamento. Pensar é verbalizar. Nosso problema, pois, não é o de saber como controlar o pensamento, mas, sim, de saber se é possível deixarmos de verbalizar, de colocar tudo em palavras. Por que colocamos em palavras as nossas respostas e reações? Por que fazemos isso? Por uma razão muito óbvia: para comunicarmos, para contarmos a outro o nosso sentimento. Verbalizamos, também, com o fim de fixá-lo, de contemplá-lo, de recaptar o sentimento quenos fugiu. A palavra tomou o lugar do sentimento que se foi. A palavra assume, desse modo, toda a importância, em lugar do próprio sentimento, da reação, da experiência. A palavra tonou o lugar da experiência. Dessa forma, a palavra se torna o pensamento, o qual impede ao "experimentar".
Nosso problema, pois, é o seguinte: é possível deixarmos de "verbalizar", de dar nome, de determinar? Isso é possível, evidentemente. Você o faz com frequência, porém, inconscientemente. Quando se defronta com uma crise, com um súbito desafio, não há verbalização. Você a enfrenta por maneira completa. Isso é possível, portanto, mas somente quando a palavra deixa de ser importante, o que significa: quando o pensamento, a ideia, deixa de ser importante. Quando uma ideia se torna importante, torna-se então importante o padrão, a ideologia, e a revolução, é somente a continuação, a continuidade modificada, de uma velha ideia, de uma ideia de ontem.
Nessas condições, a palavra só se torna importante quando não é importante o experimentar, quando não há o "estado de experimentar", que é enfrentar o desafio sem verbalização, sem a cortina protetora das palavras. Você dá vida à palavra, que é memória, quando é essa memória que enfrenta o desafio; porque a memória, em si, não tem vida, não é verdade? A palavra, por si só, não tem significação. Ela só ganha vitalidade, força, ímpeto, plenitude, quando é o passado, a memória, que enfrenta o desafio. Por consequência, pela ação do vivente, o que está morto volta à vida. E visto que ganha mais vida, daquilo em si que está morto, o pensamento se torna sumamente importante. O pensamento, por si só, não tem significado algum, a não ser em relação como passado, que é verbal. E não se trata de controlar o pensamento. Pelo contrário, uma mente controlada é incapaz de receber a verdade. Mente controlada é mente ansiosa, mente que resiste, que reprime, que substitui, e uma mente em tais condições está cheia de medo; e como pode estar tranquila a mente uma mente cheia de ansiedade? Só pode haver tranquilidade quando a mente não está presa na rede das palavras. Quando a mente não está mais a verbalizar toda experiência, acha-se ela, então, num "estado de experimentar".
Quando há "experimentar", não há o que experimenta nem a coisa experimentada. Nesse "estado de experimentar" que é sempre novo, que sempre é ser — embora se possa comunicar esse ser mediante o uso de palavras — o indivíduo sabe que a palavra não é a experiência, que a palavra não é a coisa, que ela nenhum conteúdo tem; só a própria "experiência" é repleta de conteúdo. O "experimentar" não é, pois, verbalização. "Experimentar" é a mais elevada forma de compreensão, porquanto é a negação do pensar. A forma negativa de pensar é a mais elevada forma de compreensão; e não pode haver pensar negativo, quando há verbalização do pensamento. Não se trata, pois, absolutamente, de controlar o pensamento, mas de se ficar livre do pensamento. E só quando a mente fica livre do pensamento, que há percepção daquilo "que é", do que é eterno, do que é Verdade.
Jiddu Krishnamurti em, "O Que Te Fará Feliz?"
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