Observando o estado de insuficiência interior
autoconhecimento

Observando o estado de insuficiência interior


Quase todos nós estamos bem firmados na vida; temos nossos lares, nossas famílias, responsabilidades, posição, emprego, etc. Mas, de modo geral, nossa vida é toda de monotonia e rotina; há tédio, sentimento de frustração, e desejamos mais do que meras conclusões lógicas, crenças religiosas e ideologias. Acho, por esta razão, que bem valeria a pena empregarmos estar tarde em investigar o que às palpadelas estamos buscando. Qual a força que nos impele a essa busca? É possível distingui-la com precisão? Pode-se saber que impulso é esse? Não nos interessam apenas os impulsos, as compulsões e temores mais superficiais; queremos saber o que é que estamos buscando, com toda a nossa vida, nossa existência. Pode-se investigar isso inteligentemente? Por certo, se não compreendemos essa busca, e a pressão, a compulsão que a determina, ela pode ser inteiramente vã e sem significação.
Assim, como pode uma pessoa investigar, por si mesma, o que está a buscar? Se somos velhos, desejamos paz, segurança, conforto; e se somos jovens, queremos prazeres, sensações, êxito na vida. E se o sucesso se nos torna inalcançável, queremos alguma coisa que nos faça valer aos olhos dos outros. Assim, pois, cada um de nós está a tatear no escuro, em busca de alguma coisa; e que coisa é essa? O que nos move é o desejo de descobrir o verdadeiro ou se existe algum estado permanente? Ou é satisfação mundana o que estamos buscando, uma posição melhor em nossos diversos ambientes?
Seria verdadeiramente desejável examinarmos a fundo esta questão, uma vez que, ao se tornarem bem claros os nossos impulsos interiores, a vida terá significação toda diferente. Uma vez libertada a mente da compulsão, dos impulsos que a tangem, da confusão, talvez não haja mais busca e, sim, uma coisa completamente diversa — o sentimento da própria liberdade. Pode-se, pois, descobrir, por nós mesmos, qual o impulso que nos tange à busca, que aqui nos trouxe para escutar? Ou existem tantos impulsos diferentes, tantos prazeres, que se torna impossível separá-los uns dos outros, para descobrirmos o impulso inicial? Consiste importante o descobrimento do impulso inicial, pois, do contrário, nenhuma significação tem a nossa busca.
Conhecemos muitas pessoas que não se cansam de dizer que estão buscando Deus, a verdade, a imortalidade, a virtude, etc., etc.; mas uma tal busca pouco significa e se acaba tornando pura mania. Parece-me bem significativo o fato de serem tão poucos — dentre dos que andam buscando — os que já descobriram algo verdadeiramente profundo e significativo. É a felicidade o que buscamos, o sentimento de estarmos preenchidos? Se buscamos sem compreender o que determina essa ânsia, nossas vidas permaneceram superficiais, pois o que se torna mais importante para nós é o preenchimento próprio; e o preenchimento nunca se completa. No momento em que uma pessoa se preenche, há sempre mais alguma coisa em que preencher-se.
São muito poderosos os nossos impulsos, e se não com­preendermos o inteiro significado dessa compulsão inte­rior, a mera busca, a meu ver, nada exprime. Verificar o que desejamos e o motivo que nos impele a desejar, isso, sem dúvida nenhuma, é essencial. Vendo-nos na incerteza, confusos, cheios de medo, desejamos, quiçá, refugiar- nos numa certa fantasia que chamamos realidade, numa certa esperança, numa certa crença. Se compreendêsse­mos, por nossos próprios meios, por que razão a mente sempre busca a segurança, talvez então alcançássemos algo, que não seria segurança, porém uma confiança de nova ordem. Eis porque considero importante examinar­mos profundamente esta questão.
Afinal de contas, é função da sociedade e dos gover­nos promover a segurança exterior. Mas a questão é que desejamos também estar seguros psicologicamente, inte­riormente, sendo por isso que nos identificamos com a nação, a religião, uma ideologia, uma crença. Nunca in­dagamos verdadeiramente se existe segurança interior e, no entanto, estamos sempre a buscá-la; e essa própria busca de segurança interior, psicológica, é o verdadeiro empecilho à segurança exterior — não achais? E é isso, obviamente, o que está acontecendo no mundo inteiro. Em virtude de nossa busca de segurança psicológica, por meio do nacionalismo, do líder, da ideologia, destrói-se a segu­rança física. Assim sendo, pode a mente, que está a bus­car sua permanência em todas as coisas — por meio de "minha pátria", "minha religião", por meio de inúmeros dogmas, crenças, ideias — descobrir, por si mesma, se de fato existe tal coisa: a permanência, a segurança interior?
Nunca indagamos se há verdadeiramente possibilida­de de segurança interior; e bem pode ser que tal coisa não exista. Esse próprio desejo de buscar segurança, per­manência, para nós mesmos, bem pode ser o fator que está condicionando a mente e impedindo a compreensão do verdadeiro. Pode, assim, a mente libertar-se de sua ânsia de segurança? Isso é possível, sem dúvida, mas só quando a mente se acha na mais completa incerteza — não a incerteza que é o oposto da certeza, porém o estado em que nada se sabe e nada se busca. Afinal de contas, nunca se poderá encontrar uma coisa nova, enquanto nos­sa mente estiver carregada de coisas velhas — todas as crenças, temores e latentes compulsões, que motivam a nossa busca de segurança. Enquanto buscarmos a segu­rança, sob qualquer forma que seja, interior ou exterior, não pode deixar de haver caos e sofrimentos. E se obser­varmos a nós mesmos, veremos que é isso o que estamos fazendo a todas as horas. Por meio da propriedade, do dinheiro, da virtude, da posição, da fama, estamos procu­rando, constantemente, produzir o sentimento de nossa permanência. E não achais importante descobrir se a men­te pode libertar-se completamente desse processo? É-nos possível experimentar realmente, por nossos próprios meios, o significado da compulsão que motiva a ânsia de segurança? Pode-se experimentar isso diretamente, e não mais tarde, noutra ocasião, porém agora, que estamos exa­minando a questão? Pode-se observar essa ânsia de se­gurança e verificar se tem alguma validade, e a fonte de onde promana?
E, se a observamos, que acontece? Sentimos, então, que se não estivéssemos interiormente seguros, se não nos identificássemos com inumeráveis ideias, ideologias, cren­ças, nacionalismos, seríamos nada, seríamos vazios, sería­mos sem importância. Por conseguinte, nossa reação ime­diata é fugir a esse sentimento de vazio, buscando algu­ma forma de riqueza interior, um certo sentimento de preenchimento; e constituímos líderes, para seguirmos, doutrinas e autoridades a que obedecermos. Mas nossa po­breza, nossa miséria interior continua; vemo-nos numa luta perene; e nunca experimentamos diretamente, de fa­to, esse estado de insuficiência interior, de vazio interior. Porém, se pudéssemos examiná-lo, experimentá-lo direta­mente — o que significa não fugir dele, recorrendo a um livro, ligando o rádio — sabeis das numerosas coisas que fazemos para fugir — se pudéssemos experimentar com­pletamente aquele estado, acho que então verificaríamos que esse vazio tem uma diferente significação. Mas esta­mos sempre tentando fugir, não é verdade? — para a igreja, o patriotismo, a ideologia, a crença. Entretanto, se pudéssemos compreender a futilidade da fuga a esse sentimento de pobreza interior, e o observássemos o exami­nássemos, com paciência, sem condenação, talvez então nos fosse revelada uma coisa de todo diferente.
Mas é dificílimo, não achais? — libertarmo-nos do medo, da ambição, da inveja. Atualmente, estamos sem­pre e sempre procurando firmar nossa própria segurança pela identificação com algo maior do que nós, seja uma pessoa, seja uma ideia. Mas, se há verdadeiro empenho em nosso esforço por descobrir a verdade, a realidade, ou Deus, temos, em primeiro lugar de nos libertarmos, por inteiro, de todos os nossos condicionamentos. Significa isso que precisamos ser capazes de estar totalmente sós e de encarar a verdade relativa ao que é, sem procurarmos nenhum meio de fuga. Se experimentardes isso, vereis que a mente, quando está verdadeiramente disposta a examinar de modo completo o problema da busca de se­gurança, disposta a examinar o seu próprio vazio, cabal e totalmente, sem desejo de fuga — vereis que essa mente se torna muito tranquila, só, livre, criadora. Esse estado criador não resulta de nenhuma luta, nenhum esforço, nenhuma busca; é o estado em que a mente, percebendo a verdade relativa a seus temores e invejas, está vigilante e silenciosa. Esse estado pode ser — e penso que é — o Real.
Krishnamurti — A Verdade Libertadora — ICK





- O Que Colocará Fim Na Superficialidade De Nossa Vida?
O homem, evidentemente, sempre buscou uma certa coisa fora de si mesmo, além de sua diária rotina de tédio, desespero, ansiedade; uma certa coisa que lhe proporcione plena satisfação e dê significado à sua vida aflita, caótica, superficial. Procuramos...

- Liberte-se De Toda Autoridade Psicológica
Adicionar legendaNesta tarde, desejo falar sobre a natureza do conflito e sobre a possibilidade de nos libertarmos totalmente de qualquer espécie de conflito. Por conflito, entendo a batalha perpétua, a inquietação, a ansiedade, desespero, angústia,...

- Somos Indivíduos?
            É bem óbvio que não somos verdadeiros indivíduos. Cada um pode ter um nome diferente, diferentes tendências, sua casa própria, sua conta-corrente no banco, pertencer a uma determinada...

- Busca Da Verdade; Meios De Fuga, Busca Sem Motivo
Vejamos, pois, se nos é possível examinar juntos este problema real da busca, (…). Pela busca, é possível achar algo novo? Por que buscamos, e que é que buscamos? Qual o motivo, o processo psicológico que nos impele a buscar? (…). Sem a compreensão...

- Krishnamurti - A Fuga Do Que É Pela Ilusão Da Busca Pela Verdade
Se nos for possível compreender integralmente o problema do buscar, do procurar, talvez estejamos em condições de compreender o complexo problema da insatisfação e do descontentamento. A maioria de nós está em busca de alguma coisa, em vários...



autoconhecimento








.