Elas são 800 famílias ou 1200 pessoas. Homens, mulheres, solteiros, casados, crianças, um bebê de poucos dias é o mais novo. Um aglomerado heterogêneo, porém com algo em comum: a miséria.
Vivem em um hotel da Av. Ipiranga, na capital paulistana, que esteve abandonado durante 5 anos. Num dos apartamentos vivem 22 pessoas, 7 adultos e 5 crianças.
O prédio tem 13 andares e não têm ligados nem a energia elétrica ou a água.
No térreo uma única torneira, que foi ligada clandestinamente pelos moradores, abastece todos que ali vivem e que, com baldes, sobem as escadas com a água de que necessitam.
Um dos moradores, entendido em eletricidade, puxou fios (provavelmente de algum poste próximo) e faz instalações elétricas no prédio, mas somente as áreas comuns e 80 apartamentos têm luz.
A singular comunidade está muito bem organizada, além de uma síndica, na portaria, um coordenador registra num livro diariamente todas as entradas e saídas dos moradores do prédio. Existem regras de convivência que estão escritas em um cartaz à vista de todos. A principal é: “o meu direito termina onde começa o do outro”.
Nas portas dos apartamentos estão escritos os nomes de seus habitantes.
Na cozinha do hotel há uma equipe encarregada de cozinhar para todos os moradores. As cozinheiras usam toucas de plástico cobrindo os cabelos. A higiene é preservada. No almoço servem 400 refeições e no jantar 1200.
Existe uma árdua, porém recompensadora tarefa diária: às 4 horas da madrugada uma equipe vai às ruas para conseguir donativos de alimentos e retornam, em média, duas horas depois.
Outro grupo, este de mães, sai do prédio às 5 horas para, juntas, levarem as crianças que estão matriculadas em creches ou escolas fundamentais e que se localizam bem longe de onde moram.
Os que trabalham também saem cedo, pois para muitos os locais de trabalho são distantes.
Quem são essas pessoas? De onde vieram?
Muitos são emigrantes de outros estados que vão para a capital paulistana por causa de sua fama de ter empregos para todo mundo. Outros são desabrigados que tiveram seus barracos destruídos por alguma enchente.
Estão nesse hotel há pouco mais de um mês, mas hoje é o dia de sua expulsão do prédio porque a empresa construtora proprietária do imóvel conseguiu na justiça a reintegração de posse.
Um aparato policial foi montado: interditaram as ruas de acesso e cercam o prédio com mais de 200 homens, inclusive Polícia de Choque.
Um policial fala com os moradores dizendo que eles podem entrar para tomar café e têm até às 7:45 horas para saírem do prédio.
E quando eles saem, levando seus pouquíssimos pertences, há muito choro e crianças assustadas.
Um repórter pergunta à antiga síndica o que representa para ela aquele momento e ela responde com voz resignada, mas firme: “representa que eu sou pequena diante do poder público”.
A essas alturas da reportagem que assistia, eu já estava chorando feito bezerro desmamado e pensando ao mesmo tempo: não sou a favor de ocupação de prédio alheio, mas quantos imóveis do Estado existem por este Brasil que estão desocupados e se deteriorando ao tempo ... por que não usá-los para abrigar esses sem teto que pululam pelo país?
Quando a mídia faz estardalhaço com os desabrigados de enchentes, logo surgem iniciativas governamentais de construção de casas populares para esse povo habitar depois. Com certeza custará muito mais caro do que reformar ou adequar prédios públicos abandonados para abrigar os sem teto.
E numa hora dessas, em que assisti com o coração apertado, o sofrimento e desespero daquela gente, cadê os milionários e bilionários que poderiam oferecer alguma ajuda?
Cadê a solidariedade? Cadê a humanidade?
Cadê o fim da ganância que faz com que uma única pessoa ganhe em um dia o suficiente para dar casa para todos aqueles que foram despejados e ainda sobrar muito dinheiro?
Cadê a consciência de que somos todos Um?
Vocês sabem?
Imagens: http://g1.globo.com/videos/profissao-reporter/v/ocupacao-parte-1/1384594/
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