autoconhecimento
Pode-se achar um elemento capaz de dissolver o "eu"?
[...]Desejamos encontrar alguma coisa que dissolva o "eu", não é assim? Pensamos que há vários modos de a encontrarmos, ou sejam, a identificação, a crença, etc.; mas todos eles estão no mesmo nível: nenhum é superior aos outros, porque todos têm o mesmo poder de fortalecer o "eu". Pois bem, reconheço o "eu", onde quer que esteja operando, percebo sua energia e suas forças destruidoras. Qualquer que seja o seu nome, ele é uma força isolante, uma força destrutiva; e desejo encontrar um meio de dissolvê-lo. Deveis ter feito a vós mesmos esta pergunta: "Vejo o eu operando a todas as horas, e produzindo sempre ansiedade, temor, frustração, desespero, sofrimento, não só a mim mesmo mas também a todos os que me cercam. É possível dissolver esse eu, não parcialmente, mas completamente?" — Podemos penetrar até à sua raiz e dissolvê-lo?" — Essa é a única maneira de agir, não achais? Não quero ser inteligente só parcialmente, quero sê-lo de maneira integral. Os mais de nós somos inteligentes em camadas, vós provavelmente num sentido e eu noutro sentido diferente. Alguns de vós sois inteligentes no exercício de vossa profissão, outros em suas atividades de escritório, etc. Os indivíduos são inteligentes em sentidos diferentes, nunca somos integralmente inteligentes. Ser integralmente inteligente, significa estar desacompanhado do "eu". E isso é possível? Se empreendo essa ação, qual a vossa reação? Como não estamos numa reunião de discussão, não respondais, por favor; ficai cônscios dessa ação. As coisas que ela implica, e que tenho tentado mostrar-vos, hão de produzir uma reação em vós. Que reação é essa?
É possível a ausência do "eu"? Sabeis que é possível. Quais são, então, os ingredientes, os requisitos necessários? Qual o elemento que produz esse resultado? Posso descobri-lo? Estais seguindo o que estou dizendo, senhores? Quando faço a pergunta "posso descobri-lo?", estou naturalmente convencido de que é possível descobri-lo. Já criei uma experiência, na qual o "eu" irá fortalecer-se. Não é assim? A compreensão do "eu" requer grande soma de inteligência, vigilância, atenção, incessante observação, para o não deixarmos escapulir. Eu, que sinto sincero interesse, desejo dissolver o "eu". Quando assim falo, sei que é possível dissolver o "eu". tende paciência, por favor. No momento em que digo "Quero dissolver tal coisa" e no processo que sigo para dissolvê-la, há experiência por parte do "eu". Como é possível não deixar o "eu" experimentar? É bem evidente que o estado criador não é experiência do "eu". A criação ocorre quando o "eu" não está presente; porque a criação não é intelectual, não é produto da mente, não é auto-projeção, mas, sim, algo que está além de toda experiência, como sabemos. É possível ficar a mente tranquila de todo, num estado de não-reconhecimento, de não-experimentar, num estado em que a criação possa acontecer — isto é, num estado em que que o "eu" não esteja presente, em que o "eu" esteja ausente? estou me fazendo claro ou não? Vede, senhores, o problema é este, não é verdade? Todo movimento da mente, positivo ou negativo, representa uma experiência, que de fato fortalece o "eu". É possível a mente não reconhecer? Só é possível quando há silêncio completo, não o silêncio que é experiência do "eu" e que, por conseguinte, fortalece o "eu".
Existe uma entidade separada do "eu", que o observa e o dissolve? Estais compreendendo? Pensamos que existe, não é verdade? A maioria das pessoas religiosas pensam que existe esse elemento. O materialista diz: "É impossível destruir o "eu"; ele só pode ser condicionado e reprimido — política, econômica, socialmente, prendê-lo firmemente dentro de um certo padrão, e subjugá-lo. Por conseguinte, é possível fazê-lo viver num alto nível, com moralidade, sem influir em coisa alguma, mas observando o padrão social e funcionando como simples máquina."Isso nós sabemos bem. Há outras pessoas, as chamadas religiosas — na realidade não são religiosas, embora assim as chamemos — que dizem: "Fundamentalmente, esse elemento existe. Se pudermos entrar em contato com o mesmo, ele dissolverá o "eu". — Procurai ver o que estamos fazendo. Estamos apenas pondo o "eu", à força, num canto. Se voz deixais pôr à força num canto, vereis o que acontecerá. Gostaríamos que existisse um elemento atemporal, distinto do "eu" — e denominamo-lo Deus. Ora, existe tal elemento, concebível pela mente? Pode ser que exista ou pode ser que não exista; não estamos tratando disso. Quando a mente busca um estado espiritual independente do tempo, que se porá em ação para destruir o "eu", não é essa uma outra forma de experiência que fortalece o "eu"? Quando credes, não é isso, realmente o que sucede? Quando credes que existe a verdade, que existe Deus, um estado de eternidade, de imortalidade — não representa isso um processo de fortalecimento do "eu"? O "eu" projeta essa coisa que, segundo sentis e credes, há de vir, para destruir o "eu". E tendo projetado essa ideia de continuidade num estado atemporal, como entidade espiritual, estais pronto para experimentar esse estado, e toda experiência dessa espécie só servirá para fortalecer o "eu". Por conseguinte, que fizestes? De fato não destruístes o "eu", apenas lhe destes um nome diferente; o "eu" continua a existir, visto que o experimentastes. Nessas condições, a nossa ação, de princípio a fim, é sempre a mesma; nós é que pensamos que ela evolui, se desenvolve, se torna cada vez mais bela; mas, se observardes interiormente, é sempre a mesma ação que se verifica, sempre o mesmo "eu" funcionando em níveis diferentes, com rótulos diferentes, com nomes diferentes.
Que acontece ao perceberdes integralmente o processo do "eu", suas invenções astuciosas e extraordinárias, sua inteligência, como ele se cobre com a capa da identificação, da virtude, da experiência, da crença, do saber; ao reconhecerdes que estais andando em círculo dentro de uma gaiola que ele fabricou? Ao perceberdes esse fato, ao tomardes pleno conhecimento dele, não fica a vossa mente extraordinariamente tranquila? — mas não em virtude de compulsão, de recompensa, de temor? Quando reconhecerdes que todo movimento da mente é simples maneira de fortalecer o "eu", quando observardes, perceberdes esse fato, quando ficardes plenamente cônscio do mesmo, na ação, quando chegardes a esse ponto — não ideologicamente, verbalmente, não por meio de experiência, mas, sim, porque vos achais de fato nesse estado — vereis então que, em tal estado de completa tranquilidade, a mente não tem nenhum poder de criar. Tudo o que a mente cria está dentro de um círculo, está compreendido na esfera do "eu". Quando a mente é não-criadora, há criação, que não é um processo passível de reconhecimento.
Não se pode reconhecer a realidade, a verdade. Para que a verdade se manifeste, devem desaparecer a crença, o saber, a experiência, a virtude, o cultivo da virtude, — que é coisa diferente de "ser virtuoso". A pessoa "virtuosa", a pessoa que está cônscia de estar cultivando a virtude, nunca encontrará a realidade. Pode ser uma pessoa muito honrada, mas é inteiramente diferente do "homem da verdade", do homem que compreende. Para o "homem da verdade", a verdade surgiu na existência. O homem virtuoso é um homem de direito, e o homem de direito nunca poderá compreender o que é a verdade; porque, para ele, a virtude é uma capa do "eu", uma maneira de fortalecer o "eu"; pois ele cultiva a virtude. Quando diz: "devo ser um homem sem avidez", o estado em que é não-ávido, e no qual "experimenta", fortifica o "eu". Eis porque é importante ser pobre, não só de bens terrenos, mas também de crença e saber. O homem rico de bens terrenos, ou o homem rico de saber e de crenças, nunca conhecerá senão a escuridão, e será o centro de toda sorte de malefícios e sofrimentos. Mas se vós e eu, como indivíduos, pudermos perceber todo esse funcionar do "eu", saberemos então o que é o amor. Asseguro-vos que essa é a única reforma capaz de transformar o mundo. O amor não é o "eu". O "eu" não pode reconhecer o amor. Dizeis "amo", e, então, justamente porque o dizeis, não há amor. Mas quando conheceis o amor, não existe "eu". Quando há amor, não há "eu".
Krishnamurti em, Quando o pensamento cessa
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