Por que uma pessoa se suicida?
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Por que uma pessoa se suicida?


PERGUNTA: Tenho desejo de me suicidar; a vida não tem finalidade nem significação alguma. Para qualquer lado que olhe, não vejo senão desespero, sofrimento e ódio. Por que devo continuar a viver neste mundo monstruoso?

KRISHNAMURTI: Por que uma pessoa se suicida? Não há diferentes maneiras de nos suicidarmos? Não se suicidam, quando se identificam com sua pátria? Não se suicidam, ao se tornarem membro de um partido, ao ingressarem numa seita? Não se suicidam quando acreditam em alguma coisa? Isto é, se entregam de corpo e alma a algo que é “maior”; essa coisa “maior” é a “projeção” daquilo que pensam que deveriam ser; a identificação de si mesmo com uma coisa maior (e essa coisa maior é o seu desejo de algo mais digno) é uma maneira de nos suicidarmos. Escutem isso; não o rejeitem, Senhores.

Muitos de vocês estão identificados com este país; estiveram na prisão, tem lutado. Não se suicidaram por uma causa muito insignificante? Outro se suicida por não mais ter crença; tornou-se cínico, toda a sua vida intelectual o levou, apenas ao desespero e ao sofrimento, e por isso ele se suicida. O homem que crê e o homem que não crê, tanto um como outro se suicidaram, cada um à sua maneira, visto que todos dois querem fugir de si mesmos. Querem fugir, lhes servindo de fuga a pátria, a ideia do nacionalismo, a ideia de Deus; e quando Deus e o nacionalismo falham, ou quando falha a pátria ou o ideal que ela representa, esses homens se vêem na escuridão. E, também, quando qualquer de nós depende de um amigo ou depende da pessoa amada, se nos tiram esse arrimo, nos vemos de novo à beira do precipício e dispostos a dar o salto na treva. Dessa forma, todos nós — pela identificação com algo que é “maior”, pela crença, e por várias outras maneiras de fuga, procuramos evitar a nós mesmos; e quando tornamos a cair em nós mesmos, nos vemos perdidos, sós, desesperados. E estamos prontos a nos suicidar. Tal é a nossa condição, não acham? Uma pessoa que amam os abandona, e sentem ciúmes; revela-se a vacuidade da mente e do coração de vocês e ficam aterrados; e, conseqüentemente, estão disposto a se abrigarem num novo refúgio; e assim por diante.

Assim, pois, enquanto não compreendermos a nós mesmos, nos acharemos sempre na orla da escuridão. Dizemos que o mundo é horrível, que o mundo é miserável. O mundo, porém, é uma coisa que nós criamos, o mundo são as nossas relações com outro. Se nessas relações há dependência, então tem de haver temor, frustração, desilusão; e daí, o desejo de suicídio Todavia se vocês têm uma crença muito forte, ela os contém; e essa crença mesma os condiciona a mente, conscientemente, de modo que não veem a necessidade de exame interior; essa crença atua ela própria como meio de fuga. Quanto mais religiosa uma pessoa, tanto menor a inclinação para o suicídio.

Quanto mais indagam, quanto mais investigam, tanto maior se torna o medo de conhecerem intimamente a vacuidade de própria solidão. Mas, não devem olhar de frente esse vazio, sem estarem amparado em alguma coisa? Não devem se colocar no estado em que se veem completamente só, e compreender esse estado? Não devem se ver sós, para acharem aquilo que “é só”, aquilo que não está contaminado, que nunca foi pensado? Não podem, porém, alcançar esse “estado de só”, se possuem medo da solidão. Quase todos temos medo de olhar a nós mesmos, e temos por esta razão muitas vias de fuga; e quando se mostram improfícuas essas vias, tornamos a cair em nós mesmos. É este o momento oportuno para nos examinarmos interiormente; temos de compreender esse vazio, e não fugir-lhe da presença, por meio de ritos, de distrações de qualquer espécie, do saber ou da crença.

Só podem examinar esse vazio quando a mente de vocês nele se absorve por inteiro, quando tomam conhecimento dele sem nenhuma tendência a traduzi-lo e sem desejarem que ele se modifique – e isso é coisa muito difícil. Visto sermos em geral, muito preguiçosos, preferimos nos refugiar numa crença qualquer ou nos suicidar. Assim, pois, é só quando uma pessoa compreende o que significa a solidão e a ela se sujeita, aí, somente, essa pessoa se purifica para “ser só”; e apenas essa solidão pode achar aquilo que é o ser, onde não existe o “eu”, com todas as suas lutas, contradições e confusões.

Krishnamurti – AUTOCONHECIMENTO – BASE DA SABEDORIA – 18 de fevereiro de 1953




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